INOCÊNCIA, HIPOCRISIA

E PIRATARIA

 

 

É roubo se apropriar de um produto sem pagar. É correto o governo Lula enfrentar a pirataria. É errado ir à luta sem estar preparado, sem conhecer as estratégias alimentadoras da maior indústria de serviços da atualidade. Foi bom (discutível se certo ou errado) o governo ter feito vista grossa por quase duas décadas, permitindo que micro e pequenas empresas tivessem acesso aos avanços diários da informática. Será errado, como dar um tiro no pé, sair caçando e punindo indiscriminadamente os empreendedores depois de tê-los incentivado (por omissão premeditada ou circunstancial) ao uso de programas sem licença. É certo agir para proteger os direitos da indústria (apesar delas não precisarem dessa ajuda). Mas é errado agir contra os interesses do Brasil para sobreviver num mercado global comandado e regulado pelos interesses das grandes corporações americanas.

Micro-empresas competem com mega-empresas. Veja estes dois exemplos. O comércio de materiais para a construção civil, historicamente dominado por pequenas empresas familiares, assiste, nestes últimos anos, ao crescimento (físico e quantitativo) das mega lojas de material. A consequência da entrada destes competidores, super-capitalizados e super-capacitados, é a falência de milhares de pequenos negócios. Em São Paulo, acaba de ser inaugurada a primeira mega loja (de muitas), atuando no segmento de móveis e objetos de decoração. Chama-se Etna, e a larva de sua erupção irá enterrar outros milhares de pequenas empresas. Nestes e em outros muitos casos, a sobrevivência de alguns pequenos só será possível em condições especiais de competição que, se não forem (ou não são) criadas pelo governo, serão (ou são) criadas pela necessidade, através de “jeitinhos”, orgulho nacional, única arma que resta em um país que não consegue reverter uma espiral econômica recessiva. Neste ambiente, a luta é predadora, pois onde não há novos consumidores, há que se tomá-los do concorrente.

O resultado desta caçada aos moldes em que está sendo proposta, tem dois resultados possíveis:

a)     Vai ser absolutamente eficiente, acabando com a competitividade de micros e pequenas empresas, principalmente de comércio e serviço, que sobrevivem quase heroicamente no mercado.

b)     Vai ser absolutamente ineficaz porque o governo não terá estrutura de fiscalização capaz de dar conta do recado, mas deixará sua marca nos pobres coitados que servirão de bode expiatório.

Ameaçar empreendedores com multas de 3000 vezes o valor do software não tem eficácia alguma, não ajuda ninguém. Os empreendedores brasileiros não são bandidos, são sobreviventes em uma realidade econômica que não existe a pedido deles, mas à revelia deles.

Existe um caminho alternativo. Ele passa, em primeiro lugar, pelo reconhecimento de que o governo “deixou” o barco correr, sendo, portanto, responsável pelo estado atual das coisas. Em segundo lugar, passa pela aprovação de uma lei que permita à maioria possuir softwares legais, porque é isto que a maioria quer. Para elaborar esta lei apresento para discussão as seguintes proposições:

1)       Em 95% dos casos (ou mais), os softwares são lançados no Brasil apenas na língua inglesa. Este fato, além de agredir o cidadão porque o obriga, por lei, a pagar por um software que ele não entende (!!!), provoca o uso inadequado ou errado do aplicativo. Deveríamos, portanto, permitir a venda legal de um software apenas quando fosse oferecida uma versão em português, versão esta que deveria ser obrigatoriamente aprovada por uma Universidade pública federal. Só então, o uso sem licença poderia ser considerado “pirata” e passível de punição.

2)     O enriquecimento das empresas de software se sustenta no mecanismo das versões novas. Aparentemente, ninguém obriga você a comprar a versão nova, pois, aparentemente, a sua não deixa de funcionar. Aparentemente. Na verdade, um mecanismo invisível começa a pressioná-lo assim que a primeira cópia da nova versão é vendida. Quem vive no meio, sabe que toda nova versão entende as anteriores, mas as versões anteriores não entendem as posteriores. O macete é mudar a estrutura do arquivo de trabalho gerado pelo programa e incorporar rotinas para ler os arquivos gerados por versões anteriores. Exemplificando: a versão 5 consegue ler (entender) arquivos gerados pela versão 4, mas a versão 4 não consegue ler arquivos gerados pela versão 5. Está feita a armadilha. Em um momento futuro qualquer, você, que tem a versão 4, começará a receber arquivos de seus clientes ou fornecedores gerados pela versão 5, que você (sua versão do programa) não consegue ler. É quando o mecanismo invisível aperta o seu pescoço, impedindo-o de respirar. Sua única salvação é adquirir a versão mais recente. Para mudar os rumos dessa política de comercialização que escraviza usuários, precisamos de uma lei que diga o óbvio: quando você compra um software, você compra a solução dos problemas a que ele se propõe resolver e não a maneira como eles são resolvidos (esta varia de marca para marca), de versão para versão. O que deve ser pago em uma nova versão é o valor agregado, pois o principal é pago na primeira vez que o produto é adquirido.

É imoral, portanto, “forçar” uma venda deste modo. Mas, por razões que não cabem serem discutidas aqui, as grandes corporações modernas estão preocupadas com fluxo de caixa e não com moralidade. Neste mundo globalizado, um novo papel para o estado é o de criar e manter normas que, pelo menos, limitem a imoralidade. Uma destas normas seria a prévia classificação dos softwares quanto à área de problemas que se propõe resolver. Uma vez classificado, o software não poderia mudar de classificação em função de acréscimos ou melhorias. Exemplificando, um software classificado como “editor de texto”, por mais recursos que venham a ser acrescentados, continuaria pertencendo à classe “editor de texto”. Uma vez classificado, qualquer novo usuário pagaria o preço cheio, mas usuários já possuidores de uma licença pagariam um percentual do valor.

3)      A complexidade dos softwares aumenta em uma velocidade muita maior do que a complexidade das empresas. E as necessidades das empresas, dentro do seu porte e segmento de atividade, são extremamente estáveis. Mas os softwares continuam sendo produzidos para a maior das empresas, que tem o maior número de requisitos e os mais complexos processos. A planilha de cálculos líder do mercado oferece recursos para atender necessidades complexas de matemáticos, economistas e estatísticos. Por causa deste tipo de coisa, todos os softwares conhecidos do mercado são incrivelmente subutilizados. O usuário que quer apenas fazer as operações elementares é obrigado a pagar por uma complexidade que não usa. O editor de texto mais usado tem recursos para um escritor profícuo produzir originais de modo rápido, organizado e eficiente. Mas quantos de nós o usamos para gerar mais do que algumas cartas (ainda?), relatórios e contratos? O governo deveria incentivar as empresas de software a oferecer versões mais simples, a um custo menor. Para tanto, bastaria acrescentar na classificação proposta no item 2 acima, uma sub-classe que identificasse o software de acordo com o público-alvo a que ele se destina - o que implica satisfazer um conjunto específico de necessidades. Esta classificação poderia ter 3 níveis, de acordo com o porte do usuário: médias e grandes empresas, micros e pequenas empresas, uso residencial.  Para melhor referência, vamos identificá-los como usuários do tipo 1, 2 e 3 respectivamente.

A proposta que faço de classificação (considerando itens 2 e 3), significa que para um software ser protegido contra a pirataria, precisaria estar obrigatoriamente registrado e classificado segundo o seu propósito e os recursos que oferece (abrangência de soluções). Tal classificação permitiria que as próprias empresas estabelecessem e registrassem o preço da versão completa (usuários 1) e estabelecessem um desconto sobre este preço para as versões destinadas aos usuários de tipo 2 e 3. Caberia ao órgão classificador apenas fazer a análise de adequação de cada versão ao público que se destina. Ou seja, atestar se aquela proporcionalidade de preço é justa em relação à parcela das funções que executa. Em resumo, teríamos um selo, dado por um instituto de informática de uma grande universidade (várias universidades seriam habilitadas) que significaria: este produto foi analisado e aprovado pela Universidade Tal, contém as funções mais usadas em Micro e Pequenas Empresas, e seu preço tem um desconto de 40% em relação ao preço da versão completa.

4)     O preço dos principais aplicativos do mercado inviabiliza que pequenas empresas tenham licença de todos os softwares, em todas os seus micros. Como exemplo, orcei os softwares mínimos necessários para uma pequena empresa de serviços que tenha 12 funcionários, e 11 computadores (10 estações de trabalho e 1 servidor de rede). Considerei que a empresa necessita apenas dos aplicativos básicos tais como sistema operacional, pacote de aplicativos de escritório, pacote gráfico (apenas em 2 máquinas) e antivírus, mais os aplicativos do servidor (sistema operacional de rede e firewall). O custo total das licenças chegará a aproximadamente a R$ 42.000,00. Sabendo que, em média, surge uma nova versão a cada 2 anos, o rateio mensal significará um custo de R$ 1.750,00. Se você não é pequeno empresário, consulte um para saber quanto tempo ele aguentaria com um custo mensal deste. Pior, este é o custo para o micro-empresário que subsidia o preço cobrado para as grandes corporações que compram as licenças em pacotes (500, 2.000, 10.000 micros...) por um preço unitário que é uma parcela ínfima do preço de prateleira.

5)     Uma forma de ajudar pessoas físicas, micro e pequenas empresas é muito simples de ser criada. Bastaria exigir que todo software para ser comercializado no o Brasil tivesse que ser vendido com uma licença com direito a um endosso. Este mecanismo permitiria que grupos, cooperativas e revendas de software, pudessem negociar a compra de grandes lotes de licença em seu nome para depois repassá-las ou revendê-las separadamente (através do endosso) às micro e pequenas empresas. Teríamos aí uma segunda conseqüência extremamente valiosa para o país, qual seja, que todo software teria um mercado de “segunda mão” graças ao endosso, o que beneficiaria ainda mais empresas, aquelas que não podendo estar absoluta e continuamente atualizadas, estariam apenas um passo atrás, adquirindo a versão anterior de quem comprou a nova.

6)      Ainda outro problema acontece. Como nem toda empresa gosta da estratégia de anunciar com grande antecedência o lançamento de uma nova versão, deveria ser exigido que a compra de uma licença garantisse a atualização do software por um determinado período, digamos de 1 ano. Ou seja, neste prazo, qualquer nova versão teria que ser cedida gratuitamente.

7)      Finalizando, e sem me estender em maiores comentários, o valor da multa pelo uso de um software pirata, deveria ser de no máximo o dobro do valor da versão completa (aí incluído o pagamento pela regularização do uso). Este é um valor que pune, mas não desequilibra a empresa, não constrange a aplicação da multa e torna o processo rápido porque qualquer caminho jurídico para evitá-la, demandará custos maiores do que a própria multa.

Para encerrar, listo alguns aspectos positivos que vejo na criação de um sistema de classificação e registro de softwares similar ao aqui apresentado:

  1. As empresas fabricantes seriam as maiores interessadas em obter o registro, pois sem ele não poderiam comercializar legalmente o produto.
  2. Seriam ainda mais incentivadas porque a ação judicial contra a pirataria só poderia ser aplicada a programas registrados e devidamente adequados às leis brasileiras.
  3. A ação judicial impetrada pelas empresas estaria legalmente reforçada, permitindo ações muito mais rápidas, o que seria, ainda, um desestímulo para a compra de softwares piratas.
  4. A pirataria sofreria um forte desestímulo na medida em que softwares muito mais baratos seriam oferecidos no mercado. A pirataria deixaria de ser conveniente tanto para quem produz cópia pirata quanto para quem a compra.
  5. As empresas teriam interesse em produzir versões mais baratas porque significaria aumentar o faturamento incorporando para si as vendas que antes eram dos piratas.
  6. Com o endosso, mais pessoas, mais micros e pequenas empresas em todo o Brasil seriam, no médio prazo, beneficiadas.
  7. Ofereceria às Universidades oportunidades fantásticas de aprimoramento de seu corpo discente na medida em que teriam a responsabilidade de analisar cada software.
  8. Não haveria qualquer necessidade de fiscalização quanto à prática dos preços, pois o mecanismo de selo permite que os próprios usuários sejam os fiscais. Esta é uma grande qualidade da proposta: é desnecessária a criação de qualquer organismo fiscalizador porque o sistema é autogerenciável.

Não sejamos hipócritas. Interessou ao país (governo) conduzir o processo como foi conduzido. Não sejamos inocentes. A padronização é a fonte de riqueza almejada por todas as “casas” de software. E o grande e fundamental veículo para a disseminação com objetivo de padronização foi (e é) a distribuição pirata. Ou alguém é inocente ainda para acreditar que os gigantes seriam o que são se existissem apenas usuários legais? Ou mesmo que eles teriam vendido o que já venderam sem a grande disseminação virótica que a pirataria propiciou? Agora, após os hábitos terem sido formados e os fabricantes não precisarem mais da ferramenta “pirata”, não pode o governo ficar ao lado deles e vir penalizar a todos, sob pena de parecer, simplesmente, calhorda.

Inversamente à simples caçada ao uso pirata de softwares que, além de injusta, tem o atributo de ser ruim para todo mundo, o caminho aqui oferecido busca dar vantagem para todos os envolvidos: produtores de software, empresas de todos os portes, usuários residenciais, lojistas e governo.

Este texto, evidentemente, não se basta. Mas creio ter cumprido com minha parte e espero ter estimulado líderes de opinião e um ou mais parlamentares, para trocarmos a cruzada contra os empreendedores por uma cruzada a favor do país.

Paulo Vogel

Setembro de 2004

 

ADENDO: O Governo e o Software Livre

O governo brasileiro parece ter feito uma opção pelo software livre. Antes de fazer algumas considerações, apresento uma classificação dos softwares de acordo com o tipo de licença:

A)     Paga. Sem limite de uso, normalmente de fabricante conhecido, com garantia de serviço de suporte e correção de erros gratuitamente.

B)     Shareware - Inteiramente gratuita, mas com funções limitadas, servindo para criar o hábito de uso e necessidade da compra da versão completa. É o caso de um software antivírus conhecido no mercado.

C)    Adware - Condicional à visibilidade de propaganda. São equivalentes, em qualidade, aos softwares pagos. É o caso de alguns programas de emeio.

D)     Freeware - Inteiramente gratuita, mas produzida por uma pessoa ou pequenos grupos que não garantem a continuidade no futuro, normalmente não atendem as necessidades das empresas e, quase obrigatoriamente, apresentam “bugs”. É o caso de uma infinidade de softwares surgidos das noites insones de muitos jovens pelo mundo afora.

E)     Freeware - Inteiramente gratuita, mas que servem como cavalo de Tróia para a obtenção de algum outro benefício. É o caso de agendas on-line que visam obter endereços de emeio dos usuários.

F)      Freeware e Open Source – Gratuita (aparentemente), produzida por um grupo grande de pessoas e/ou entidades, normalmente de modo distribuído, mas com controle centralizado, mas ainda não se tornou padrão. É o caso do Linux.

G)   Freeware e Open Source – Gratuita (aparentemente), idem, idem, e já se tornou padrão. É o caso do servidor web Apache.

Seja para as empresas, seja para o governo, os únicos que merecem alguma atenção são os softwares enquadráveis nos itens “F” e “G”. O problema principal deles, é que não são softwares padrão, o que significa que qualquer profissional ou serviço para eles tende a ser mais caro. Todo mundo conhece Windows, mas quem conhece o ambiente Unix? Em recente palestra que participei, foi relatado que recentemente em um determinado órgão do governou chegou a “ordem” de implantar um sistema operacional open source em todas as máquinas. Tudo bem se 3 meses antes o órgão não tivesse pago uma pequena fortuna pela nova versão do software que já vinha utilizando há anos. Qual a vantagem da decisão? Você consegue imaginar o quanto de investimento em treinamento e capacitação foi jogado fora? E consegue imaginar quanto mais será necessário para recapacitar todos os usuários? E quanto tempo irá levar para que todo o sistema tenha a mesma estabilidade e qualidade de antes?

A única coisa grátis no software livre é a licença. Mas todo o resto pode até vir a ser mais caro. O quanto vai depender de cada caso.

O recado aqui é simples:

§         Software livre só é barato quando usado apenas em casa ou em operações sem fins lucrativos;

§         Software livre bom sem garantia só é bom para quem pode ter uma relação amorosa com eles, onde custo/benefício não envolve valor monetário;

§         Software livre bom só é bom quando sua base instalada é suficientemente disseminada para deixar os custos de desenvolvimento e suporte competitivos com os custos de suporte dos softwares pagos.

A decisão pode ter sido um grande acerto ou um grande erro, não vejo meio termo. Se a decisão foi política com o objetivo de acelerar o processo de disseminação do software livre, o acerto dependerá da disposição das autoridades em pagar pela transição. Isto inclui os recursos que estarão (ou não) disponíveis para, além de substituir o sistema operacional, realizar todos os ajustes (ou adaptações) nos aplicativos que antes “rodavam” muito bem, mas que no novo “ambiente”, começarão a apresentar problemas de execução. É aguardar e torcer para que, enquanto a transição é feita, as autarquias públicas não sofram uma grande pane, com reflexos na vida dos cidadãos que dependem, freqüentemente, delas. Incentivar o software livre é elogiável. Colocar a estabilidade da operação de sistemas críticos em risco é irresponsável.

O que o Governo Federal está fazendo?

Criou a Câmara de Implementação do Software Livre, que será conduzida
pelo ITI (Instituto Nacional de Tecnologia da Informação), órgão ligado à
Casa Civil, portanto, dentro do Palácio do Planalto.

Firmou convênio entre o Comitê Gestor da ICP-Brasil (Infra-Estrutura de
Chaves Públicas Brasileira) e a empresa paranaense Conectiva. Este acordo possibilitou que, desde o fim de abril, navegadores (browsers) do sistema operacional aberto Conectiva/Linux 9 venham com o certificado digital do governo brasileiro instalado. "Dos candidatos à Presidência da República, o Lula era o único que colocou no programa de governo a preferência por soluções abertas e livres nessa área", lembrou Rodrigo Stultzer, diretor da Conectiva. Antes disso, o certificado brasileiro havia sido disponibilizado apenas para o Windows XP, da gigante Microsoft.

Fruto da parceria do ITI com a estatal de energia Eletronorte, um projeto piloto de 20 telecentros equipados de computadores com software livre na
Amazônia, de nome Rede da Floresta, contribuirá igualmente, em breve, para a disseminação e popularização de programas desse tipo.

"Não seria correto usar dinheiro público para treinar e formar gratuitamente pessoas em favor de um monopólio mundial", defendeu Sérgio Amadeu, presidente do ITI.

E o que eles estão pensando?

"O mercado brasileiro de informática movimenta cerca de US$ 3,2 bilhões por ano. Destes, são gastos US$ 1 bilhão com impostos para a América do Norte - o que equivale a todo o orçamento anual do Ministério de Ciência e Tecnologia - e apenas US$ 200 milhões ficam com o governo brasileiro. Tudo isso, em um País onde menos de 10% da população tem acesso e mais da metade dos softwares em uso são piratas." (Marcelo Branco, da ONG Software Livre RS, organizadora do IV Fórum).

"Quisera eu que o governo do meu País tratasse dessa maneira (como o Brasil) o uso do software livre." (Jon Maddog Hall, norte-americano,
diretor-executivo da Linux International, um dos "papas mundiais" do
software livre).

"Outros governos, em geral, vêm adotando uma prática ruim ao pensar
exclusivamente em softwares proprietários na interação com os cidadãos."
(David Axmark, da Suécia, criador do My SQL, considerado o banco de dados de código aberto mais popular do mundo).

"As iniciativas do Governo brasileiro revelam inteligência e conhecimento da questão de liberdade de conhecimento, do desenvolvimento da indústria local, dos custos visíveis e invisíveis do software proprietário. No Brasil, o uso por parte do Estado é muito maior que nos EUA. É um dos poucos exemplos em que um país pobre têm vantagem sobre os países ricos." (Diego Saravia, argentino, criador da distribuição Ututo GNU/Linux, programa aberto que roda em CD-ROM e não precisa ser instalado no disco rígido do computador)

Gabinete do Deputado Elvino Bohn Gass - Deputado Estadual (PT) - autor da lei do Software Livre

Boletim Especial ao IV Fórum Internacional do Software Livre

Prof. Silvio Lemos Meira, diretor-presidente do Centro de Estudos e Sistemas Avançados em Recife em http://www.cic.unb.br/docentes/pedro/trabs/francesa.htm

Prof. Pedro Antonio Dourado de Rezende, Departamento de Ciência da Computação Universidade de Brasília

http://portal.softwarelivre.org/contact.php - formulário para envio de mensagem

http://portal.softwarelivre.org/expertsQuery.php - emeios de gente que apóia o software livre

http://portal.softwarelivre.org/whatisit.php - completa definição do que é software livre

Nosso projeto, em conjunto com o PSL-RS, é organizador do "Fórum Internacional de Software Livre" que acontece anualmente em Porto Alegre, desde o ano 2000. No ano passado realizamos o IV FISL com a presença de mais de 4.000 pessoas.

Neste ano o V FISL acontecerá de 02 a 05 de Junho no centro de eventos da PUC-RS.

http://www5.senado.gov.br/boletimprodasen/Anteriores/boletim2/solisdoc

 

LEI Nº 9.609 , DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998.

 

Dispõe sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de computador, sua comercialização no País, e dá outras providências.

        O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

        Art. 1º Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.

 CAPÍTULO II

DA PROTEÇÃO AOS DIREITOS DE AUTOR E DO REGISTRO

         Art. 2º O regime de proteção à propriedade intelectual de programa de computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País, observado o disposto nesta Lei.

        § 1º Não se aplicam ao programa de computador as disposições relativas aos direitos morais, ressalvado, a qualquer tempo, o direito do autor de reivindicar a paternidade do programa de computador e o direito do autor de opor-se a alterações não-autorizadas, quando estas impliquem deformação, mutilação ou outra modificação do programa de computador, que prejudiquem a sua honra ou a sua reputação.

        § 2º Fica assegurada a tutela dos direitos relativos a programa de computador pelo prazo de cinqüenta anos, contados a partir de 1º de janeiro do ano subseqüente ao da sua publicação ou, na ausência desta, da sua criação.

        § 3º A proteção aos direitos de que trata esta Lei independe de registro.

        § 4º Os direitos atribuídos por esta Lei ficam assegurados aos estrangeiros domiciliados no exterior, desde que o país de origem do programa conceda, aos brasileiros e estrangeiros domiciliados no Brasil, direitos equivalentes.

        § 5º Inclui-se dentre os direitos assegurados por esta Lei e pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País aquele direito exclusivo de autorizar ou proibir o aluguel comercial, não sendo esse direito exaurível pela venda, licença ou outra forma de transferência da cópia do programa.

        § 6º O disposto no parágrafo anterior não se aplica aos casos em que o programa em si não seja objeto essencial do aluguel.

        Art. 3º Os programas de computador poderão, a critério do titular, ser registrados em órgão ou entidade a ser designado por ato do Poder Executivo, por iniciativa do Ministério responsável pela política de ciência e tecnologia. (Regulamento)

        § 1º O pedido de registro estabelecido neste artigo deverá conter, pelo menos, as seguintes informações:

        I - os dados referentes ao autor do programa de computador e ao titular, se distinto do autor, sejam pessoas físicas ou jurídicas;

        II - a identificação e descrição funcional do programa de computador; e

        III - os trechos do programa e outros dados que se considerar suficientes para identificá-lo e caracterizar sua originalidade, ressalvando-se os direitos de terceiros e a responsabilidade do Governo.

        § 2º As informações referidas no inciso III do parágrafo anterior são de caráter sigiloso, não podendo ser reveladas, salvo por ordem judicial ou a requerimento do próprio titular.

        Art. 4º Salvo estipulação em contrário, pertencerão exclusivamente ao empregador, contratante de serviços ou órgão público, os direitos relativos ao programa de computador, desenvolvido e elaborado durante a vigência de contrato ou de vínculo estatutário, expressamente destinado à pesquisa e desenvolvimento, ou em que a atividade do empregado, contratado de serviço ou servidor seja prevista, ou ainda, que decorra da própria natureza dos encargos concernentes a esses vínculos.

        § 1º Ressalvado ajuste em contrário, a compensação do trabalho ou serviço prestado limitar-se-á à remuneração ou ao salário convencionado.

        § 2º Pertencerão, com exclusividade, ao empregado, contratado de serviço ou servidor os direitos concernentes a programa de computador gerado sem relação com o contrato de trabalho, prestação de serviços ou vínculo estatutário, e sem a utilização de recursos, informações tecnológicas, segredos industriais e de negócios, materiais, instalações ou equipamentos do empregador, da empresa ou entidade com a qual o empregador mantenha contrato de prestação de serviços ou assemelhados, do contratante de serviços ou órgão público.

        § 3º O tratamento previsto neste artigo será aplicado nos casos em que o programa de computador for desenvolvido por bolsistas, estagiários e assemelhados.

        Art. 5º Os direitos sobre as derivações autorizadas pelo titular dos direitos de programa de computador, inclusive sua exploração econômica, pertencerão à pessoa autorizada que as fizer, salvo estipulação contratual em contrário.

        Art. 6º Não constituem ofensa aos direitos do titular de programa de computador:

        I - a reprodução, em um só exemplar, de cópia legitimamente adquirida, desde que se destine à cópia de salvaguarda ou armazenamento eletrônico, hipótese em que o exemplar original servirá de salvaguarda;

        II - a citação parcial do programa, para fins didáticos, desde que identificados o programa e o titular dos direitos respectivos;

        III - a ocorrência de semelhança de programa a outro, preexistente, quando se der por força das características funcionais de sua aplicação, da observância de preceitos normativos e técnicos, ou de limitação de forma alternativa para a sua expressão;

        IV - a integração de um programa, mantendo-se suas características essenciais, a um sistema aplicativo ou operacional, tecnicamente indispensável às necessidades do usuário, desde que para o uso exclusivo de quem a promoveu.

CAPÍTULO III

DAS GARANTIAS AOS USUÁRIOS DE PROGRAMA DE COMPUTADOR

         Art. 7º O contrato de licença de uso de programa de computador, o documento fiscal correspondente, os suportes físicos do programa ou as respectivas embalagens deverão consignar, de forma facilmente legível pelo usuário, o prazo de validade técnica da versão comercializada.

        Art. 8º Aquele que comercializar programa de computador, quer seja titular dos direitos do programa, quer seja titular dos direitos de comercialização, fica obrigado, no território nacional, durante o prazo de validade técnica da respectiva versão, a assegurar aos respectivos usuários a prestação de serviços técnicos complementares relativos ao adequado funcionamento do programa, consideradas as suas especificações.

        Parágrafo único. A obrigação persistirá no caso de retirada de circulação comercial do programa de computador durante o prazo de validade, salvo justa indenização de eventuais prejuízos causados a terceiros.

 CAPÍTULO IV

DOS CONTRATOS DE LICENÇA DE USO, DE COMERCIALIZAÇÃO

E DE TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA

         Art. 9º O uso de programa de computador no País será objeto de contrato de licença.

        Parágrafo único. Na hipótese de eventual inexistência do contrato referido no caput deste artigo, o documento fiscal relativo à aquisição ou licenciamento de cópia servirá para comprovação da regularidade do seu uso.

        Art. 10. Os atos e contratos de licença de direitos de comercialização referentes a programas de computador de origem externa deverão fixar, quanto aos tributos e encargos exigíveis, a responsabilidade pelos respectivos pagamentos e estabelecerão a remuneração do titular dos direitos de programa de computador residente ou domiciliado no exterior.

        § 1º Serão nulas as cláusulas que:

        I - limitem a produção, a distribuição ou a comercialização, em violação às disposições normativas em vigor;

        II - eximam qualquer dos contratantes das responsabilidades por eventuais ações de terceiros, decorrentes de vícios, defeitos ou violação de direitos de autor.

        § 2º O remetente do correspondente valor em moeda estrangeira, em pagamento da remuneração de que se trata, conservará em seu poder, pelo prazo de cinco anos, todos os documentos necessários à comprovação da licitude das remessas e da sua conformidade ao caput deste artigo.

        Art. 11. Nos casos de transferência de tecnologia de programa de computador, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial fará o registro dos respectivos contratos, para que produzam efeitos em relação a terceiros.

        Parágrafo único. Para o registro de que trata este artigo, é obrigatória a entrega, por parte do fornecedor ao receptor de tecnologia, da documentação completa, em especial do código-fonte comentado, memorial descritivo, especificações funcionais internas, diagramas, fluxogramas e outros dados técnicos necessários à absorção da tecnologia.

 CAPÍTULO V

DAS INFRAÇÕES E DAS PENALIDADES

         Art. 12. Violar direitos de autor de programa de computador:

        Pena - Detenção de seis meses a dois anos ou multa.

        § 1º Se a violação consistir na reprodução, por qualquer meio, de programa de computador, no todo ou em parte, para fins de comércio, sem autorização expressa do autor ou de quem o represente:        Pena - Reclusão de um a quatro anos e multa.

        § 2º Na mesma pena do parágrafo anterior incorre quem vende, expõe à venda, introduz no País, adquire, oculta ou tem em depósito, para fins de comércio, original ou cópia de programa de computador, produzido com violação de direito autoral.

        § 3º Nos crimes previstos neste artigo, somente se procede mediante queixa, salvo:

        I - quando praticados em prejuízo de entidade de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo poder público;

        II - quando, em decorrência de ato delituoso, resultar sonegação fiscal, perda de arrecadação tributária ou prática de quaisquer dos crimes contra a ordem tributária ou contra as relações de consumo.

        § 4º No caso do inciso II do parágrafo anterior, a exigibilidade do tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, processar-se-á independentemente de representação.

        Art. 13. A ação penal e as diligências preliminares de busca e apreensão, nos casos de violação de direito de autor de programa de computador, serão precedidas de vistoria, podendo o juiz ordenar a apreensão das cópias produzidas ou comercializadas com violação de direito de autor, suas versões e derivações, em poder do infrator ou de quem as esteja expondo, mantendo em depósito, reproduzindo ou comercializando.

        Art. 14. Independentemente da ação penal, o prejudicado poderá intentar ação para proibir ao infrator a prática do ato incriminado, com cominação de pena pecuniária para o caso de transgressão do preceito.

        § 1º A ação de abstenção de prática de ato poderá ser cumulada com a de perdas e danos pelos prejuízos decorrentes da infração.

        § 2º Independentemente de ação cautelar preparatória, o juiz poderá conceder medida liminar proibindo ao infrator a prática do ato incriminado, nos termos deste artigo.

        § 3º Nos procedimentos cíveis, as medidas cautelares de busca e apreensão observarão o disposto no artigo anterior.

        § 4º Na hipótese de serem apresentadas, em juízo, para a defesa dos interesses de qualquer das partes, informações que se caracterizem como confidenciais, deverá o juiz determinar que o processo prossiga em segredo de justiça, vedado o uso de tais informações também à outra parte para outras finalidades.

        § 5º Será responsabilizado por perdas e danos aquele que requerer e promover as medidas previstas neste e nos arts. 12 e 13, agindo de má-fé ou por espírito de emulação, capricho ou erro grosseiro, nos termos dos arts. 16, 17 e 18 do Código de Processo Civil.

 CAPÍTULO VI

DISPOSIÇÕES FINAIS

         Art. 15. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

        Art. 16. Fica revogada a Lei nº 7.646, de 18 de dezembro de 1987.

        Brasília, 19 de fevereiro de 1998; 177º da Independência e 110º da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 20.2.1998 e retificado no D.O.U. de 25.2.1998