EXTRATO DE: O RELOJOEIRO CEGO

Richard Dawkins – 1941-...

Ed. Cia. Das Letras – 1986/2001/2002

 

 

 

12

[sobre a ainda difícil aceitação do darwinismo]O que havia de errado com os filósofos e matemáticos que a deixaram escapar? E como pode ser que uma idéia tão poderosa ainda seja tão estranha aos olhos do grande público? Por que ela teve que esperar por dois naturalistas vitorianos?

 

13

Estamos inteiramente acostumados à idéia de que a elegância complexa indica um design fabricado, premeditado. Essa a razão na crença na existência de alguma divindade sobrenatural.

 

19

Somos mal equipados para compreender o muito pequeno e o muito grande, coisas cuja duração se mede em picossegundos ou giga-anos, partículas que não têm posição, forças e campos que não podemos ver ou tocar e que conhecemos tão-somente porque afetam coisas que podemos ver ou tocar.

 

20

...os especialistas em motores não entendem muito de asas, e os especialistas em asas só entendem os motores de um modo vago. Os especialistas em asas nem sequer compreendem as asas com precisão matemática total: só sabem prever como uma asa se comportará em condições de turbulência à medida que puderem examinar um modelo em um túnel de vento ou em uma simulação por computador.

 

23

A seleção natural, o processo cego, inconsciente e automático que Darwin descobriu e que agora sabemos ser a explicação para a existência e para a forma aparentemente premeditada de todos os seres vivos, não tem nenhum propósito em mente.Ela não tem nem mente nem capacidade de imaginação. Não planeja com vistas ao futuro. Não tem visão nem antevisão. Se é que se pode dizer que ela desempenha o papel de relojoeiro da natureza, é o papel de um relojoeiro cego.

 

24

... só depois de Darwin é possível ser um ateu intelectualmente satisfeito.

 

26

A trava da minha bicicleta tem 4096 combinações. (...) Posso girar as rodas ao acaso, ler o numero resultante e exclamar, analisando retrospectivamente: “Incrível, as chances contra o aparecimento desse número são de 4096:1. Um pequeno milagre!” (...) Mas uma dessas combinações, a 1207, é a única que solta a trava. Se alguém girasse as rodas ao acaso e chegasse a 1207 na primeira tentativa, seria fácil roubar a bicicleta, e pareceria ter ocorrido um milagre.

 

29

É retrospectivamente que decidimos se o nosso conglomerado aleatório teve êxito como voador ou nadador. (...) O amontoado final de células pode bem vir a ser um cavador eficiente como uma toupeira ou um trepador eficiente como um macaco; poderia ainda ser muito bom em windsurfe, ou em agarrar trapos ensebados, ou em caminhar em círculos de diâmetro decrescente até desaparecer. A lista poderia continuar indefinidamente. Ou será que não?

 

O que significa ser bom em alguma coisa? O requisito mínimo para que reconheçamos um objeto como animal ou planta é que ele seja capaz de prover para sua vida, de algum modo (mais precisamente, que ele – ou ao menos alguns indivíduos de sua espécie – seja capaz de viver o bastante para procriar).

 

34

Para qualquer nível dado de organização complexa, pode-se normalmente encontrar uma explicação satisfatória uma ou duas camadas mais abaixo, e ponto final.

 

Para quem gosta de “ismos”, o nome mais adequado para meu tipo de explicação do funcionamento das coisas provavelmente seria “reducionismo hierárquico”. (...) Reducionismo... é apenas outro nome para o honesto desejo de entender como as coisas funcionam.

 

36

O problema dos físicos diz respeito às mais elementares origens e leis naturais. O problema dos biólogos é o problema da complexidade. O biólogo tenta explicar o funcionalmente e o surgimento das coisas complexas com base em coisas simples.

 

38

Complexidade é a qualidade de ser estatisticamente-improvavel-quando-não-explicado-retrospectivamente.

 

45

Sem saber, os cegos usam ecos de seus próprios passos e de outros sons para pressentir a presença de obstáculos.

 

60

Comprimentos de onda diferentes ativam as fotocélulas de nossa retina sensíveis ao vermelho ou ao azul. Mas não há traço algum do conceito de comprimento de onda em nossa percepção subjetiva das cores – nada sobre “como é” ver o azul ou o vermelho nos informa sobre o comprimento respectivo das ondas.

 

63

É precisamente porque nossos sentidos humanos não são capazes de fazer o que os morcegos fazem que temos dificuldade em acreditar. É difícil imaginar que um animalzinho seja capaz de fazer “de cabeça” algo que só conseguimos entender por meio de instrumentos artificiais e cálculos no papel. (...) Essa inconsistência de nosso ceticismo deve-se muito simplesmente ao fato de que podemos ver, mas não podemos ecolocalizar.

 

68

Mesmo que a maior autoridade do mundo fosse incapaz de explicar algum fenômeno biológico notável, isso não significaria que se trata de algo inexplicável. Muitos mistérios persistiram por séculos....

 

70

Cem anos pode ser muito tempo para nós, uma vez que supera nossa expectativa de vida; para um geólogo, cem anos são aproximadamente um milésimo de sua unidade usual de medida!

 

74

O exemplo mais simples de sistemas de não-aleatoriedade que me ocorre é um buraco. Apenas objetos menores do que o buraco podem passar por ele.

 

Quanto mais um satélite está próximo de seu sol, mais rápido precisa mover-se para compensar a gravidade do sol e permanecer em uma órbita estável. Para cada órbita específica existe apenas uma velocidade de deslocamento do satélite que lhe permite permanecer nessa órbita.

 

76

O numero de modos possíveis de arranjar 20 tipos de coisas em cadeias com 146 elos é inconcebivelmente grande – Asimov o chama de “numero hemoglobina”. (...) O numero de cadeias de 146 elos possíveis é 20 x20 146 vezes. (..) O numero que estamos buscando, o “numero hemoglobina”, é (quase) um 1 seguido de 190 zeros! A chance de se obter a hemoglobina por pura sorte é de uma contra esse numero descomunal.

 

Na seleção cumulativa, as entidades “reproduzem-se” ou, de alguma outra maneira, os resultados de um processo de peneiragem são incluídos na peneiragem seguinte, cujos resultados por sua vez passam para a próxima e assim por diante. As entidades são sujeitas à seleção ou classificação ao longo de muitas “gerações”  sucessivamente.

 

84

Não existe um alvo muito distante, nenhuma perfeição final que sirva de critério de seleção, embora a vaidade humana acalente a idéia absurda de que nossa espécie é o objetivo final da evolução. Na vida real, o critério de seleção é sempre de curto prazo: o êxito reprodutivo.

 

91

Biomorfo é o nome cunhado por Desmond Morris para as vagas formas semelhantes a animais que figuram em suas pinturas surrealistas.

 

92

O corpo não é transmitido de uma geração a outra; os genes, sim. Os genes influenciam o desenvolvimento embrionário do corpo em que se encontram. E então esses mesmos genes são ou não são transmitidos à geração seguinte.

 

94

Assim os genes que sobrevivem tendem a ser, automaticamente, aqueles que conferem aos corpos as qualidades que os ajudam a sobreviver.

 

101

A forma específica de um biomorfo presa deveria determinar sua vulnerabilidade a ser capturado, por exemplo, por formas específicas de biomorfos predadores. Tais critérios de vulnerabilidade não deveriam ser inseridos pelo programador. Deveriam emergir de um modo análogo àquele como as próprias formas emergem.

 

115

Saltar poderia teoricamente levar ao premio em menos tempo – em um único salto. Contudo, em vista das chances astronômicas de fracasso, a seqüência de pequenos passos, cada qual partindo do êxito acumulado dos passos anteriores, é o único método viável. ... pois... quanto menor for o salto, tanto mais provável será que ele resulte numa melhora e menos provável que acabe em morte.

 

119

[Uma analogia da mudança gradativa é analisar um degradée de uma cor qualquer. Mudanças mínimas que levam do quase branco ao quase preto.]

 

127

Desconfio, de fato, que todo o processo da evolução, da remota semelhança ao mimetismo quase perfeito, ocorreu muito rapidamente varias vezes, em diferentes grupos de insetos, durante todo o longo período em que a visão das aves tem sido praticamente tão boa quanto é hoje.

 

128

Na verdade, não importa quanto é remota e fraca a semelhança de um inseto com um graveto, deve haver alguma intensidade de penumbra, ou algum grau de distância do olho ou de distração da atenção do predador que faça com que até mesmo um olho muito bom seja logrado pela remota semelhança.  (...) O importante no que tange à intensidade da luz, distância entre inseto e predador, distância entre imagem e centro da retina e vaiáveis similares é que são todas variáveis contínuas. Elas variam em graus imperceptíveis que vão da extrema invisibilidade à extrema visibilidade. Essas variáveis contínuas favorecem a evolução contínua e gradual.

 

130

Alguns animais unicelulares possuem um ponto fotossensível, e atrás dele um pequeno filtro de pigmento. O filtro protege o ponto da luz proveniente de uma direção, o que lhe dá alguma “idéia” de onde a luz provém.

 

No hiperespaço genético, o Nautilus parece ser o vizinho imediato de algum aperfeiçoamento obvio e imediato, mas não dá o pequeno passo necessário.

 

137

Não existe uma divisão brusca entre animais que respiram na água e animais que respiram no ar. Diferentes animais podem passar 99 por cento de seu tempo na água, ou 98, ou 97 e assim por diante até zero por cento.

 

De que serve meia asa? Como as asas começaram? Muitos animai pulam de galho em galho, e às vezes caem no chão. Especialmente em um animal de pequeno porte, toda a superfície corporal capta o ar e auxilia o salto, ou amortece a queda, atuando como um tosco aerofólio. Qualquer tendência a aumentar a área da superfície em relação ao peso ajudaria.

 

A seleção natural favoreceria, então, as pequeninas abas-asas prototípicas.

 

Existem animais vivos que ilustram primorosamente cada estágio desse contínuo. Há rãs que planam com grandes membranas interdigitais, serpentes arborícolas cujo corpo achatado capta o ar, lagartos com abas ao longo do corpo e vários tipos diferentes de mamíferos que planam com membranas esticadas entre seus membros, mostrando-nos como os morcegos devem ter começado a voar.

 

[nas cobras] existe uma série contínua e gradativa que vai da saliva comum ao veneno letal.

 

[A falta de um sentido aguça um dos demais.] Humanos cegos com freqüência aprendem a fazer uso de ecos.

 

Cinco por cento de visão é melhor do que nenhuma visão.

 

140

Darwin escreveu: “Se fosse possível demonstrar que existiu algum órgão complexo que não poderia absolutamente ter sido formado por numerosas e sucessivas modificações pequenas, minha teoria cairia por terra.”

 

Stephen Gould, em o “O polegar do panda”, argumentou que a evolução pode ser mais solidamente corroborada por indícios de imperfeições marcantes do que por indícios de perfeição. Um exemplo é o linguado.

 

141

Os linguados são peixes teleósteos (com bexigas natatórias)... e têm uma tendência acentuada a ser achatados na vertical. ... Os ancestrais do linguado foram para o fundo do mar e deitaram-se de lado mas isso ocasionava o problema de que um olho ficava sempre virado para a areia do fundo, sendo na prática inútil.

 

Um filhote de linguado começa a vida nadando próximo à superfície, e seu corpo é simétrico e verticalmente achatado como o de um arenque. Mas logo o crânio começa a crescer de um modo estranho, assimétrico, de modo que um olho, por exemplo, o esquerdo, vai migrando em direção ao topo da cabeça e por fim passa para o outro lado. O jovem peixe assenta no fundo do mar com ambos os olhos virados para cima, uma estranha visão picassiana.

 

O crânio inteiro do linguado contém o testemunho desvirtuado e deturpado de suas origens. Sua própria imperfeição é um poderoso indício de sua história antiqüíssima, uma história  de mudança passo a passo e não de um design deliberado.

 

[ Não me satisfaz essa explicação sobre o linguado. Ela levanta duas questões:

 

a)   se um dos olhos faz um trajeto de um lado da cabeça para o outro, reproduzindo o caminho evolutivo, então, a história evolutiva está registrada nos genes, ou seja, é possível reproduzi-la;

b)   se o linguado, inicialmente, tinha um olho de cada lado, porque ele iria se deitar de lado? A explicação que ele dá é fraca pois implicaria em que todos os peixes teleósteos deveriam se deitar de lado.

 

Essa questão chama a atenção para uma outra, a das fases pelas quais passa um embrião em se desenvolvimento. Em muitos casos, eles parecem reproduzir estágios ancestrais da espécie. ]

 

 

 

144

A “lei de Dollo” afirma que a evolução é irreversível.

 

É imensamente improvável que a mesma trajetória evolutiva venha a ser percorrida duas vezes. E pareceria também improvável, pelas mesmas razoes estatísticas, que duas linhas evolutivas viessem a convergir exatamente para o mesmo ponto final a partir de diferentes pontos de partida.

 

Portanto, um testemunho ainda mais notável do poder da seleção natural é o fato de poderem ser encontrados na vida real numerosos exemplos nos quais linhas evolutivas independentes parecem ter convergido, saindo de pontos de partida muito diferentes, para o que parece acentuadamente ser o mesmo ponto final.

 

146

Embora acreditemos que todas as aves e morcegos devem ter tido um ancestral comum, se reconstituirmos suas linhagens até um passado suficientemente remoto, esse ancestral comum também foi o de todos os mamíferos (inclusive nós mesmos) e de todas as aves.

 

150

O princípio da eletrolocalização em alguns peixes... A corrente parte da metade frontal do peixe, entra na água em linhas que fazem uma curva e retornam até a extremidade posterior do animal formando um campo contínuo, um casulo invisível de eletricidade em torno do corpo do peixe. Mas para que possamos visualiza-las, é mais fácil imaginar uma família de linhas curvas que partem do peixe através de uma série de vigias espaçadas ao longo da metade dianteira do corpo, todas descrevendo uma curva na água e reentrando no peixe na extremidade de sua cauda. O peixe possui o equivalente de um minúsculo voltímetro que monitora a voltagem em cada “vigia”. Quando o peixe está suspenso na água sem obstáculos por perto, as linhas são curvas regulares. Todos os minúsculos voltímetros registram “voltagem normal” em suas respectivas vigias.

 

155

Até cerca de 100 milhões de anos atrás, a América do Sul era ligada à África a leste a à Antártida ao sul. A Antártida ligava-se à Austrália, e a Índia à África via Madagascar, formando o que chamamos de continente meridional de Gonduana. O outro continente, a Laurásia, era formado pelo que hoje chamamos de América do Norte, Groelândia, Europa e Ásia (menos a Índia).

 

156

Cada ocupação, a de cavar, a de caçar, a de pastar etc., foi o contexto para uma evolução convergente independente em dois ou três continentes distintos.

 

170

A tecnologia de informação dos genes é digital. Esse fato foi descoberto no século passado por Gregor Mendel, ainda que ele não o exprimisse dessa maneira. Mendel mostrou que nossa hereditariedade não é uma mistura da de nossos pais. Recebemos nossa hereditariedade em partículas discretas. No que respeita a cada partícula, ou nós a herdamos ou não a herdamos. Na verdade, como salientou R. A. Fisher, um dos pioneiros do que hoje chamamos neodarwinismo, esse fato da hereditariedade particulada sempre esteve óbvio, bastaria refletir sobre os sexos. Herdamos características de nossos pais, um homem e uma mulher, mas cada um de os ou é homem ou é mulher, nunca hermafrodita. [Nunca!!!!] Evidentemente, com freqüência parece mesmo ter havido uma mescla, graças aos efeitos produzidos nos corpos pelas unidades genéticas. Os filhos de uma pessoa alta com uma baixa, ou de uma pessoa negra com uma branca, muitas vezes têm características intermediarias. Mas essa aparência de fusão aplica-se apenas aos efeitos sobre os corpos, sendo devida aos pequenos efeitos somados de grandes números de partículas.

 

[ Lei do Limite da Analogia, ou Lei de Vogel: Nada que é diferente pode ser absolutamente idêntico. ]

 

174

O darwinismo pós-Fisher é chamado neodarwinismo. Seu caráter digital não é um fato acidental que por acaso se aplica à tecnologia da informação genética. O caráter digital provavelmente é uma precondição necessária para que o próprio darwinismo funcione.

 

Polimerização: a capacidade de certos tipos de moléculas juntarem-se em cadeias de comprimento indefinido.

 

Polinucleotídeos: polímeros específicos usados pelas células vivas.

 

Surpreendentemente, apenas cerca de 1% da informação genética nas células humanas, por exemplo, parece ser de fato usado: mais ou menos o equivalente a um volume da Enciclopédia Britânica. Ninguém sabe porque os outros 99% estão ali.  (...) Uma bactéria possui capacidade de informação menor do que uma célula humana, cerca de 1.000 vezes menor, e provavelmente a usa quase toda: não há muito espaço para parasitas. Seu DNA poderia conter “apenas” uma copia do Novo Testamento!

 

178

A “posição” de um gene significa a posição ao longo de um certo cromossomo. A posição física exata do cromossomo na célula não faz diferença; aliás, ele flutua no meio fluido, de modo que sua posição física varia, mas cada localização no cromossomo está precisamente endereçada em uma ordem linear ao longo do cromossomo, como acontece com os endereços precisamente alocados numa fita de computador, mesmo que espalhada pelo chão em vez de enrolada em uma bobina.

 

Os chimpanzés têm 48 cromossomos, e não 46 como nós. Espécies com parentesco muito próximo, têm porções tão grandes de conteúdos adjacentes em comum que é fácil identifica-las como basicamente iguais, mesmo que não possamos usar o mesmo sistema de endereçamento nas duas espécies.

 

Quando um espermatozóide com seus 23 cromossomos, é produzido a partir de uma célula do  corpo com 46 cromossomos, ele só recebe – aleatoriamente – uma das duas cópias de cada localização endereçada. O resultado é que cada espermatozóide ou óvulo produzido é único quanto aos conteúdos de suas localizações, ainda que seu sistema de endereçamento seja idêntico em todos os membros da espécie.

 

180

Temos um ancestral em comum com os chimpanzés, portanto em um certo momento da historia dos seres humanos (ou dos chimpanzés) deve ter ocorrido uma mudança no numero de cromossomos. Podemos ter perdido um cromossomo (dois se fundira), talvez os chimpanzés tenham adquirido um a mais (um se dividiu em dois).

 

Para que possam envolver-se em qualquer tipo de ação, os símbolos codificados do DNA precisam ser traduzidos para um outro meio. Inicialmente, são transcritos em símbolos exatamente correspondentes no RNA, que também tem um alfabeto de 4 letras. Em seguida, são traduzidos para um tipo diferente de polímero, chamado de polipeptídio ou proteína.

 

183

Certas moléculas de proteínas, chamadas enzimas, são máquinas que encetam uma dada reação química. Cada tipo de máquina de proteína gera seu próprio produto químico. (...) Para se ter uma idéia do tamanho dessas máquinas protéicas: cada uma é constituída por aproximadamente 6 mil átomos. Há cerca de 1 milhão de máquinas assim em cada célula, em mais de 2 mil tipos diferentes, cada qual especializado em uma operação específica na fábrica química, isto é, na célula.

 

185

Vacas e ervilhas possuem um gene quase idêntico, o gene da histona H4. Seu texto de DNA tem 306 caracteres. Não se pode dizer que ocupa um mesmo endereço em todas as espécies porque não tem sentido comparar rótulos de endereços em espécies diferentes, mas podemos dizer que há um trecho de 306 caracteres nas vacas que é virtualmente idêntico a um trecho de 306 caracteres nas ervilhas. Vacas e ervilhas diferem em apenas 2 desses 306 caracteres.

 

189

O fato é que a seleção natural serve mais para impedir a mudança evolutiva que para a impelir.

 

190

Cerca de 5 mil letras de DNA degeneram-se por dia em cada célula humana e são imediatamente substituídas pelos mecanismos de reparo.

 

191

Parece haver dois tipos de “direito à existência”: o das gotas de orvalho, que pode ser resumido como “probabilidade de se formar mas não de durar”, e o das rochas, que pode ser resumido como “improbabilidade de se formar, mas probabilidade de durar por muito tempo uma vez formado”.

 

193

A propriedade da auto-replicação é o ingrediente vital que um planeta sem vida como a Terra em seus primórdios precisou possuir para que lhe fosse dada a chance de abrigar a vida.

 

194

Podemos presumir que os replicadores atuam como algum tipo de molde ou gabarito.

 

200

Pesquisadores alemães nos anos 70 puseram replicase e pequenas moléculas que serviriam de matéria-prima para formação de RNA no tubo de ensaio, mas não semearam a solução com RNA. Não obstante, uma grande molécula de RNA evoluiu espontaneamente no tubo de ensaio, e a mesma molécula tornou a evoluir inúmeras vezes em subseqüentes experimentos independentes!

 

Acontece simplesmente que a estrutura do RNA viral é tal que faz o maquinário celular produzir cópias suas.

 

Enzimas: máquinas que fabricam outros compostos nas células, os produtos dos genes.

 

207

Um milagre é um colossal golpe de sorte.

 

210

A seleção cumulativa não pode funcionar a menos que haja alguma máquina de replicação e um poder replicador mínimos, e a única máquina de replicação que conhecemos parece ser complexa demais para ter surgido por meio de algo menor do que muitas gerações de seleção cumulativa! (...) Talvez... o criador realmente instalou o maquinário original da replicação e o poder de replicação, o maquinário original de DNA e proteínas que possibilitou a seleção cumulativa e, portanto, toda a evolução.

 

Mas é claro que qualquer Deus capaz de elaborar inteligentemente algo tão complexo quanto a máquina replicadora de DNA/proteína deve ter sido no mínimo tão complexo e organizado quanto a própria máquina. Invoca-lo, portanto, é não explicar nada, visto que sua origem fica inexplicada. É preciso dizer algo como “Deus sempre existiu” e, se nos permitirmos esse tipo de saída preguiçosa, também podemos muito bem afirmar que “o DNA sempre existiu” ou “a vida sempre existiu”, e acabou-se o problema.

 

212

O milagre de um macaco datilografar “methinks it is like a weasel” é quantitativamente grande demais, mensuravelmente grande demais, para que o admitamos em nossas teorias sobre o que de fato acontece. 

 

[ Há um fato que Dawkins deixa de analisar aqui. Ou seja, todas as frases que seriam escritas diferentes desta. A improbabilidade de que alguma frase inteligível seja escrita já não será “grande demais”. ]

 

A falha no argumento de que pelo fato de existirem bilhões de bilhões de planetas não pode ser assim tão improvável que a vida exista em outros planetas, está em inferir que, como a vida surgiu aqui, ela não pode ser tão terrivelmente improvável. Esta suposição de que qualquer coisa que aconteceu na Terra provavelmente ocorreu em outras partes do universo não pode ser feita. Este argumento estatístico está usando como pressuposto justamente aquilo que precisa ser provado. Isto não significa que não exista vida por todo o universo; significa que esse argumento específico que levou a essa conclusão não é argumento, apenas suposição.

 

Que grandessíssima pretensão supor que, de todos os bilhões de bilhões de planetas no universo, este nosso mundinho nos confins de nosso Sistema solar no fim de mundo que é a nossa galáxia foi exclusivamente escolhido para abrigar a vida!

 

215

Quanto teremos de esperar antes que eventos químicos aleatórios no planeta, a colisão térmica aleatória de átomos e moléculas, venha a resultar em uma molécula auto-replicadora?

 

216

Ao supor que não necessariamente o surgimento de organismos replicadores levem à vida inteligente, nossa estimativa sobre a quantidade de sorte que nos é permitido postular tem de ser reduzida correspondentemente. Para ser mais preciso, a máxima probabilidade contra o surgimento de vida em qualquer planeta que nos é permitido postular em nossas teorias é o numero de planetas disponíveis no universo dividido pela probabilidade de que a vida, uma vez iniciada, venha a desenvolver pela evolução uma inteligência suficiente para especular sobre suas próprias origens.

 

Suponhamos, então, que a origem da inteligência seja tão improvável que aconteceu em apenas um planeta no universo, muito embora a vida tenha começado em muitos planetas. Sendo assim, como sabemos que somos inteligentes o bastante para discutir esta questão, sabemos que a Terra tem de ser esse planeta. Suponhamos agora que a origem da vida e a origem da inteligência, dado que a vida existe aqui, são ambas, eventos altamente improváveis. Neste caso, a probabilidade de algum planeta, como a Terra, ser agraciado com esses dois golpes de sorte é o produto de duas probabilidades pequenas.

 

[Portanto] temos de encontrar uma teoria que torne a origem da vida quase inevitável.

 

A seleção cumulativa me parece suficientemente poderosa para, uma vez iniciada, ter tornado provável, se não inevitável, a evolução da inteligência.

 

[Penso que aqui ele comete um erro na medida em que ele contraria seu próprio postulado do “contínuo” evolutivo pois não há “contínuo” quando observamos e comparamos os graus de inteligência entre as espécies. Até onde posso perceber, existe uma inteligência vegetal, uma inteligência animal e uma inteligência humana, e elas são não só distintas mas de complexidade absolutamente distante uma das outras.]

 

221

Uma teoria da origem da vida a ser estudada é a teoria “mineral inorgânica” do químico Graham Cairns-Smith, de Glasgow, proposta nos anos 60, e descrita em 3 livros, o último deles “Seven Clues to the Origin of Life” (Sete pistas para a origem da vida).

 

... o processo de replicação original tem de ter sido suficientemente simples para ter surgido por meio do que denominei “seleção de um só passo”.

 

222

A química orgânica estuda um elemento específico, o carbono porque a química da vida é inteiramente vinculada a ele.... A inorgânica ocupa-se de todo o resto. (...) A propriedade essencial dos átomos de carbono que os tornam tão favoráveis à vida e à sinterização industrial é sua capacidade de unir-se e formar um repertorio ilimitado de diferentes tipos de moléculas muito grandes. (...) Cairns-Smith supõe que a vida original em nosso planeta baseou-se em cristais inorgânicos auto-replicadores como os silicatos.

 

223

DNA e proteína são dois pilares de um arco elegante e estável, que persiste desde que todas as suas partes existam simultaneamente. É difícil conceber que ele tenha surgido por algum processo passo a passo, a menos que algum andaime anterior tenha desaparecido completamente.

 

Um cristal é apenas um grande conjunto ordenado de átomos ou moléculas em estado sólido. (...) Seu modo preferido de se encaixar configura todo o cristal. Também implica que, mesmo em um grande cristal como o diamante, qualquer de suas partes é exatamente igual a qualquer outra parte, exceto quando existem falhas.

 

224

Cairns-Smith sugere um experimento. Dissolve-se em águam muito quente uma grande quantidade de hipossulfito de sódio, o fixador usado em fotografia, deixa-se a solução esfriar, com cuidado para que não caia nela nenhuma partícula de pó. A solução está então “supersaturada”, pronta para produzir cristais, mas sem “sementes” de cristais para desencadear o processo.

 

“Remova cuidadosamente a tampa da vasilha, coloque um pedaço minúsculo de cristal de hipossulfito de sódio na superfície da solução e observe admirado o que acontece. Seu cristal cresce visivelmente: fragmenta-se de quando em quando, e os pedaços também crescem (...) lobo a vasilha estará abarrotada de cristais, alguns medindo vários centímetros. E então, depois de alguns minutos, tudo pára. A solução mágica perdeu seu poder – mas se você quiser outra apresentação, é só tornar a aquecer e resfriar a solução. Estar supersaturado significa que há mais ingredientes dissolvidos do que deveria haver (...) a solução supersaturada fria praticamente não sabia o que fazer. Foi preciso “ensina-la” adicionando um pedaço de cristal que tinha de antemão suas unidades acondicionadas do modo característico dos cristais de hipossulfito de sódio. A solução teve que ser semeada.”

 

226

Argilas, barros e rochas são feitos de minúsculos cristais. Ele são abundantes na Terra, e provavelmente sempre foram. Observando a superfície de alguns tipos de argilas e outros minerais com um microscópio eletrônico de varredura, a visão é espantosa e bela. Os cristais crescem como fileiras de flores ou cactos, jardins de pétalas de rosa inorgânicas, minúsculas espirais como cortes transversais de plantas suculentas, eriçados tubos de órgãos, complexas formas angulares dobradas como uma miniatura cristalina de origami, formas sinuosas como excremento de minhoca ou pasta de dente espremida do tubo. (...) Em graus que revelam a verdadeira posição dos átomos, vemos que a superfície do cristal apresenta a mesma regularidade mas... existem falhas. Bem no meio de um trecho de espinha de peixe ordenada pode haver um pedaço idêntico ao resto, exceto pelo fato de virar-se em um ângulo diferente ou a trama pode estar disposta na mesma direção mas cada fileira “escorregou” um pouco para o lado. Quase todos os cristais que ocorrem naturalmente têm falhas. E quando uma falha aparece, tende a ser copiada à medida que camadas subseqüentes de cristal incrustam-se sobre ela.

 

235

A evolução sob a influencia dos novos replicadores – evolução mêmica – está na primeira infância.

 

238

A mão da estátua poderá se mover se, por pura coincidência, acontecer de todas as moléculas se moverem simultaneamente na mesma direção. E se então elas inverterem a direção no mesmo momento, a mão se movimentará na direção oposta. Desse modo é possível que uma estátua de mármore acene para nós. É possível calcular a probabilidade disto acontecer. O numero é tão grande que toda a idade do universo é pouco tempo para escrever todos os zeros!

 

239

Nossos olhos são formados para lidar com uma faixa estreita de freqüências eletromagnéticas (as que chamamos de luz), em algum trecho intermediário do espectro que vai das ondas longas de rádio em um extremo aos curtos raios X no outro. (...) Do mesmo modo, sabemos que as escalas de tamanho e tempo estendem-se em ambas as direções muito além do alcance da nossa visualização. (...) Nossa mente não consegue imaginar um intervalo de tempo tão breve quanto um picossegundo, mas podemos fazer cálculos com picossegundo. Nossa mente não pode imaginar um intervalo de tempo tão longo quanto 1 milhão de anos, muito menos os milhares de milhões de anos que os geólogos computam rotineiramente.

 

Entre as coisas que são ligeiramente improváveis está a probabilidade de 36 para uma de conseguir dois 6 jogando uma só vez um par de dados. E...

2 235 197 406 895 366 368 301 559 999 para uma – esta é a probabilidade de uma jogada perfeita de bridge na qual cada um dos quatro jogadores recebe as cartas completas de um único naipe. (...) em algum trecho dessa faixa estão aquelas coincidências que nos causam um frio  na espinha, como sonhar com certa pessoa pela primeira vez em décadas e de manha ficar sabendo que ela morreu naquela noite.

 

249

A mutação e a seleção natural, juntas, podem levar, no longo intervalo de tempo geológico, a um acumulo de complexidade... Há duas maneiras pelas quais esse acumulo pode ocorrer:

 

a)   a primeira recebe o nome de “genótipos coadaptados”;

b)   a segunda, de “corrida armamentista”.

 

Na idéia dos genótipos adaptados, um gene tem um efeito específico porque existe uma estrutura que lhe permite atuar. Um gene não pode efetuar as conexões cerebrais a menos que haja um cérebro sendo conectado. Não haverá um cérebro sendo conectado a menos que haja um embrião completo em desenvolvimento. E não haverá um embrião completo em desenvolvimento a menos que haja todo um programa de eventos químicos e celulares, sob a influencia de muitos outros genes e muitas outras influencias causais não genéticas.

 

[ Aqui se manifesta a minha teoria egocêntrica de todas as partículas do universo. Neste caso, cada gene vai “vivendo” a sua vida, fazendo o que é pra fazer, até que em algum momento o que ele faz interfere no que outro gene faz ou, inversamente, o que outro gene faz em algum momento interfere no que ele faz. ]

 

Em certo sentido, todo o processo de desenvolvimento embrionário pode ser visto como um empreendimento cooperativo, realizado conjuntamente por milhares de genes.

 

[ É aí que eu divirjo. Não existe empreendimento cooperativo. Existem empreendimentos individuais inter-relacionados. A construção de uma cidade não é um empreendimento cooperativo. Sua existência se deve às ações absolutamente egoístas de milhões de indivíduos que ocorreram em uma determinada unidade de tempo suficiente para gerar algo que passou a ser identificado como “cidade”. ]

 

 

253

É difícil para uma equipe minoritária conseguir a supremacia, mesmo uma equipe minoritária que poderia, no final, fazer o serviço de maneira mais eficiente. A equipe majoritária apresenta uma resistência automática a ser desalojada, pela simples razão de ser majoritária. Isto não significa que uma equipe majoritária jamais poderia ser desalojada. Se não pudesse a evolução emperraria.

 

254

Os ancestrais do leão começaram a comer carne e o dos antílopes capim, por puro acaso, acidentalmente.

 

256

Nos anos 80, descobriu-se que qualquer gene “individual”, isto é, uma passagem individual lida continuamente do texto do DNA, não se encontra isolado inteiro num só lugar. Se de fato lermos as letras codificadoras conforme elas ocorrem ao longo do cromossomo (isto é, se fizermos o equivalente de sair da disciplina do “sistema operacional”) , encontraremos fragmentos de “sentido” denominados éxons, separados por porções “sem sentido” denominadas íntrons. Qualquer “gene” no sentido funcional é, na verdade, dividido em uma seqüência de fragmentos (éxons) separada por íntrons sem sentido. É como se cada éxon terminasse com um indicador que dia “continua na página 94”. Um gene completo compõe-se de toda uma série de éxons, que são efetivamente encadeados uns aos outros apenas quando são finalmente lidos pelo sistema operacional “oficial” que os traduz em proteínas.

 

258

Os seres humanos têm oito genes distintos, chamados genes de globina (usados para produzir a hemoglobina, entre outras coisas), em vários cromossomos diferentes. Parece certo que todos os oito foram copiado, em última analise, de um único gene de globina ancestral.

 

As células eucarióticas incluem todas as células, exceto as bacterianas. O mundo vivo divide-se, fundamentalmente, em bactérias e o resto.

 

260

A célula eucariótica formou-se, talvez, há 2 bilhões de anos, quando vários tipos de bactérias juntaram forças devido aos benefícios que cada uma obteria das outras.

 

Um grande passo na evolução foi dado quando as células que haviam sido produzidas por sucessivas divisões ficaram juntas em vez de seguir caminhos independentes.

 

263

Ao contrário de antigas opiniões preconcebidas, não há nada de inerentemente progressivo na evolução.

 

Se for frio, os animais acaba adquirindo espessos revestimentos de pêlos ou penas. Se for seco, desenvolvem peles impermeáveis como couro ou cera para conservar a pouca água disponível. As adaptações às condições locais afetam cada parte do corpo, sua forma e cor, seus órgãos internos, seu comportamento e a química de suas células.

 

A evolução cessará até que haja alguma mudança nas condições: o início de uma era glacial, uma alteração nos níveis pluviométricos médios da região, uma mudança no vento prevalecente.

 

O clima é importantíssimo para os animais e plantas. Seus padrões mudam no decorrer dos séculos, portanto isso mantém a evolução constantemente em movimento à medida que ela “segue” as mudanças. Mas o clima não é tudo. Existem os outros seres vivos. Para um predador como a hiena, uma parte de seu meio que é no mínimo tão importante quanto o clima são suas presas, as populações de gnus, zebras e antílopes em processo de mudança.

 

Podemos usar o termo geral “inimigos” de uma espécie para denotar outros seres vivos que dificultam a vida dessa espécie. (...) Os parasitas como a tênia são inimigos de seus hospedeiros, e estes são inimigos dos parasitas, pois tendem a evoluir neles maneiras de resistir-lhes. Os herbívoros são inimigos das plantas, e estas são inimigas dos herbívoros, pois fabricam espinhos e substâncias químicas venenosas ou de gosto ruim.

 

[ Aqui abre-se uma questão. Se as plantas fabricam espinhos evitando serem comidas, chegará um tempo em que os herbívoros terão que se tornar carnívoros. ]

 

266

As gazelas, tanto quanto os guepardos, estão sujeitas à seleção cumulativa, e também elas tenderão, no decorrer das gerações, a melhorar sua capacidade de correr velozmente, reagir com rapidez, se tornar invisíveis fundindo-se ao capim alto. (...) Mas a gazela média anual tende a tornar-se sistematicamente pior – mais difícil de ser apanhada por ser mais bem adaptada para fugir de guepardos. Novamente, a tendência à melhora progressiva nas gazelas cessaria não fosse pela tendência paralela de melhora em seus predadores. Um lado melhora um pouquinho porque o outro lado melhorou. E vice-versa.

 

268

O gado come a grama, podendo, portanto, ser considerado inimigo dela. Mas a grama também tem outros inimigos no mundo vegetal, ervas competitivas que, se crescerem sem restrições, podem revelar-se inimigos ainda piores da grama do que o gado.

 

269

A conclusão geral é: pode ser conveniente pensar em uma corrida armamentista entre duas linhagens como a do gado e a da grama, ou a das gazelas e a dos guepardos, mas nunca devemos perder de vista o fato de que ambos os participantes têm outros inimigos contra os quais estão simultaneamente envolvidos em outras corridas armamentistas.

 

272

Quando todas as arvores têm a altura da cobertura vegetal, todas têm uma exposição ao sol aproximadamente igual, e nenhuma pode dar-se ao luxo de ser mais baixa. Mas se todas fossem mais baixas, se pudesse haver algum tipo de acordo de classe para reduzir a altura oficial da cobertura vegetal na floresta, todas as arvores se beneficiariam.

 

(...) embora todos se beneficiassem caso nenhuma delas crescesse, se uma delas crescer ninguém pode se dar ao luzo de não fazer o mesmo.

 

[ Isto é basicamente o que acontece na economia. Na competição de mercado, enquanto todos estão de acordo com o preço a praticar, tudo vai medianamente bem para todos. Mas se uma empresa resolve fazer uma promoção arrasadora, não há como os concorrentes não a acompanharem. ]

 

(...) todos os organismos são mais gravemente ameaçados pelos competidores de sua própria espécie do que de outras. Os membros da própria espécie competem pelos mesmos recursos em um grau muito mais detalhado do que membros de outras espécies.

 

[Novamente uma analogia com o mercado de produtos pode ser feita. ]

 

De fato, se tanto o míssil como seu antídoto vêm melhorando à mesma taxa, podemos esperar que as versões mais recentes, mais avançadas e refinadas, e as mais antigas, mais primitivas e mais simples, tenham exatamente o mesmo grau de sucesso combatendo seus contradispositivos contemporâneos.

 

276

[ Anotação de página: A existência depende de um ponto de referência. Isto significa que alguma coisa que existe, existe porque uma outra coisa que existe provocou a necessidade da criação desta primeira. O antimíssil só existe porque existiu antes o míssil e este só existiu porque antes existiu uma tecnologia um pouco menos eficiente, e assim para trás...]

 

277

Quase todos os animais vivem em uma de duas situações: perigo de ser comido por outros animais ou de não conseguir comer outros animais...

 

279

QE – quociente de encefalização.

 

O QE é calculado por um método um tanto complicado, usando logaritmos do peso cerebral e peso corporal e fazendo comparações com os valores médios de um grupo principal, como a classe dos mamíferos.

 

282

Deve haver um limite final para a velocidade com que um guepardo ou uma gazela pode correr, um limite imposto pelas leis da física. Mas ambos avançaram para um limite inferior que tem a ver com um caráter econômico. (...) O preço é medido pelo que os economistas denominam “custo oportunidade”: a soma de todas as outras coisas de que se tem de abrir mão para se obter algo.

 

283

Um guepardo rival que não possui músculos tão grandes nas pernas pode não correr tão depressa, mas tem recursos sobrando para produzir uma quantidade adicional de leite e assim, talvez, criar mais um filhote. (...) Quando tanto guepardos como gazelas atingirem a velocidade de corrida máxima que podem “pagar” dadas suas economias internas, a corrida armamentista entre eles chegará ao fim.

 

[ Não acredito nisso. A corrida armamentista não é contínua. Ela sofre reveses em função de catástrofes ambientas, epidemias, e é isto que faz a corrida sofrer uma interrupção, ou melhor dizendo, uma descontinuidade. A corrida continua, mas em outra direção e provavelmente em outro ritmo. ]

 

 

As presas podem acabar gastando relativamente mais de seu orçamento em armamentos defensivos do que os predadores em armamentos ofensivos. Uma razão disto é que o coelho corre mais que a raposa porque ele está correndo pela vida, e ela, apenas pelo jantar.

 

284

Os genes são selecionados não por suas qualidades intrínsecas, mas por suas interações com o meio.

 

291

Em química, o típico processo de feedback positivo é a explosão, sendo comum usarmos o termo explosivo para descrever um processo descontrolado.

 

295

Darwin reconheceu que a existência e a sobrevivência eram apenas meios para se atingir um fim: a reprodução.

 

Axioma – pressuposição, algo que não precisa ser explicado.

 

Enquanto outros pensaram que os ornamentos do macho evoluíram sob a influencia da preferência estética da fêmea, Fisher raciocinou que a preferência da fêmea evoluiu dinamicamente passo a passo com a ornamentação do macho.

 

É um fato óbvio que, quando se trata de medir praticamente qualquer coisa em um animal, embora a maioria dos membros da espécie esteja bem próxima da media, alguns indivíduos esta um pouco acima dela, enquanto outros ficam abaixo.

 

Polígenes – grandes números de genes cujos efeitos são somados.

 

298

Se um homem possui genes para um pênis longo, as probabilidades de transmitir esses genes à sua filha e ao seu filho são iguais. (...) E se esse homem um ida tiver netos, os filhos de sua filha terão a mesma probabilidade de herdar seu pênis longo do que os filhos de seu filho. Ou seja, os genes podem existir em um corpo sem se expressar. Da mesma maneira, Fisher supõe que os genes da preferência das fêmeas são carregados pelo corpo dos machos, embora somente se expressem no corpo de fêmeas.

 

Se herdei os genes para cauda longa de meu pai, é provável que eu também tenha herdado genes para a preferência por cauda longa de minha mãe.

 

[ Essa questão me parece não ter nada a ver com genes e sim com funcionamento livre da mente, talvez subordinado ao ambiente social.]

 

300

Podemos seguir o mesmo tipo de raciocínio para as fêmeas. Se eu sou uma fêmea que prefere machos de cauda longa, são grandes as chances de que minha mãe também preferiu machos de cauda longa. Portanto, são grandes as chances de que meu pai tivesse cauda longa, já que ele foi escolhido por minha mãe. (...) A conclusão geral é: qualquer indivíduo, não importa o sexo, tende a possuir tanto os genes que fazem o macho ter determinada qualidade como os genes que fazem as fêmeas preferir essa qualidade, seja ela qual for.

 

307

No momento em que uma maioria, por mais insignificante que fosse, começasse a aparecer entre as fêmeas privilegiando um tipo de preferência em detrimento do outro, essa maioria seria reforçada nas gerações subseqüentes.

 

[ Nota de página: o livre arbítrio e a oferta talvez possam explicar melhor. ]

 

Sempre que pequenas minorias tendem a se tornar minorias ainda menores e que pequenas maiorias tendem a se tornar maiorias mais numerosas, temos uma receita para um feedback positivo: “Pois ao que tem se lhe dará, e terá em abundância; mas ao que não tem, até o que tem lhe será tirado”. Sempre que temos um equilíbrio instável, inícios aleatórios e arbitrários são auto-alimentadores. É o que acontece quando cortamos o tronco de uma arvore: não se sabe para onde vai cair mas quando começa a cair nada há que a traga de volta.

 

309

Lande provou que em certas condições não existe apenas um ponto de equilíbrio, mas muitos (teoricamente, um numero infinito disposto em linha reta num gráfico).

 

310

Sempre podemos identificar um sistema de feedback negativo pelo que ocorre se o “perturbamos” de modo a afasta-lo de seu “ponto fixo” ideal. Se perturbamos a temperatura de uma sala abrindo a janela, o termostato responde ligando o aquecedor para compensar.

 

Na natureza o sistema é perturbado freqüentemente por flutuações espontâneas e aleatórias, por exemplo, no número de machos devido a eventos fortuitos, favoráveis ou desfavoráveis. Sempre que isto ocorre uma combinação de seleção utilitária e seleção sexual direcionará a população para o ponto mais próximo do conjunto dos pontos de equilíbrio.

 

316

Anderson descobriu que os machos com caudas alongadas artificialmente atraíram quase 4 vezes mais fêmeas do que os que tiveram a cauda artificialmente encurtada.

 

322

No âmbito de qualquer ilha individual, as palavras mudam a uma taxa constante, de um modo muito parecido com o da mutação ocasional dos genes.

 

332

O cronômetro de radiocarbono anda a um ritmo bem rápido, tão rápido que, após alguns milhares de anos, sua mola já está quase toda desenrolada e o relógio deixa de ser confiável. Ele é útil para datar material orgânico na escala temporal arqueológica/histórica que lida com centenas ou alguns milhares de anos, mas não serve para a escala temporal evolutiva, que lida com milhões de anos.

 

334

O gradualista supostamente acredita que, ao longo de todos esses milhões de gerações, os indivíduos com pernas dez milionésimos de centímetro mais compridas do que a media tinham uma vantagem sobre os possuidores de pernas de comprimento médio. Acreditar nisso equivale a acreditar que os israelitas viajaram 22 metros por dia pelo deserto.

 

O incremento médio de 1 cc por geração, que a caricatura do gradualista supõe conferir uma significativa vantagem na sobrevivência, é apenas um centésimo de milésimo da diferença entre os cérebros de Anatole France e Oliver Cromwell!

 

338

As macromutações ocorrem sem duvida nenhuma. O que está em questão não é se elas têm algum papel na evolução; em outras palavras, se elas são incorporadas ao pool genético de uma espécie ou se, ao contrário, sempre são eliminadas pela seleção natural. Um celebre exemplo de macromutação é a “antenapédia” das drosófilas.  (...) Moscas que não têm antenas e sim um par extra de pernas, que crescem nos lugares onde deveria haver antenas. Essa é uma verdadeira mutação, pois resulta de um erro de cópias do DNA. E essa mosca mutante se reproduz sem variação de tipo se receber cuidados no laboratório para que possa sobreviver até ser capaz de se reproduzir.

 

Na muitas boas razoes para rejeitar todas essas teorias saltacionistas da evolução. Uma delas, bastante trivial, é que , se uma nova espécie realmente surgisse num único passo mutacional, os membros dessa nova espécie teriam muita dificuldade para encontrar parceiros de acasalamento.

 

[ A analogia argumentativa contra o saltacionismo é o ajuste de foco em um microscópio. Grandes ajustes só pioram a situação enquanto ajustes mínimos têm 50% de chance de gerar uma melhora no foco. ]

 

Fisher explicou: “É suficientemente óbvio que qualquer grande desarranjo terá uma probabilidade muito pequena de melhorar o ajuste, enquanto no caso de alterações muito menores do que a menor dentre as efetuadas intencionalmente pelo criador ou operador, a chance de melhora deve ser quase exatamente um meio.

 

342

Quanto mais “macro” for a mutação, mais provável é que seja perniciosa e menos provável que venha a ser incorporada à evolução de uma espécie.

 

Um saltacionista extremo poderia postular que a evolução ocorreu em um único passo mutacional no seguinte exemplo: um genitor não tinha olho nenhum, apenas pele onde poderia haver um olho. Teve um filho anormal, com olho plenamente desenvolvido, todo completo (...).

 

Se decidirmos considerar um numero suficientemente grande de melhoras, sua ocorrência conjunta torna-se tão improvável a ponto de ser, para todos os efeitos, impossível.

 

346

Como já existe maquinário genético para produzir um segmento de cobra, novos segmentos podem facilmente ser acrescentados por um único passo mutacional.

 

Podemos ter certeza de que, na evolução das cobras, os números de vértebras mudaram em inteiros, não em frações. Não dá para imaginar uma cobra com 26,3 vértebras.

 

Especiação: maneira como se originam novas espécies. Processo pelo qual uma única espécie se torna duas espécies, uma das quais pode ser a mesma que a original.

 

Toda vez que uma nova espécie-filha começa a “brotar”, o processo corre o risco de ser frustrado pelo cruzamento entre espécimes das duas vertentes.

 

350

Elas se tornam tão dessemelhantes que, após um tempo, os naturalistas as veriam como pertencentes a “raças” diferentes. Após mais um tempo, terão divergido tanto que as classificaríamos como espécies diferentes.

 

Um princípio amplamente aceito da ecologia é o de que duas espécies com o mesmo modo de vida não coexistirão por muito tempo no mesmo lugar, pois competirão, e uma ou outra será impelida à extinção.

 

A teoria da especiação resultante da separação geográfica inicial há muito tempo tem sido a pedra fundamental do preponderante neodarwinismo ortodoxo, sendo até hoje aceita por todas as vertentes como o principal processo gerador de novas espécies.

 

354

Os catastrofistas do século XVIII e XIX acreditavam que a evidente progressão do registro fóssil na verdade refletia uma série de criações separadas, cada qual encerrada por uma catastrófica extinção em massa. A última delas foi o dilúvio de noé.

 

Tanto o catastrofismo como o saltacionismo e o pontuacionismo moderno são profundamente superficiais

 

356

Seriam necessárias 12 mil gerações para os animais evoluírem de um peso médio de 40 gramas (tamanho de camundongo) para um peso médio superior a 6 milhões de gramas (tamanho do elefante). Supondo que 5 anos seja o tempo de uma geração, 12 mil gerações abrangeriam 60 mil anos. Esse tempo é demasiado breve para ser medido pelos métodos geológicos comuns de datação de registro fóssil.

 

O certo é caracterizar as idéias dos pontuacionistas como “gradualistas, mas com longos períodos de estase pontuando breves episódios de mudança gradual rápida”.

 

O galho da árvore evolutiva não se bifurca em dois ramos iguais; em vez disso, existe um galho principal do qual brota um pequeno ramo lateral.

 

360

Um “discretista” extremo não só acredita que a evolução tenha velocidade variável, mas também julga que a velocidade muda abruptamente de um nível discreto a outro, como a caixa de cambio de um automóvel.

 

Os defensores da “hipótese da velocidade continuamente variável”, acreditam que os ritmos da evolução flutuam continuamente, de muito rápido a muito lento e nulo, com todos os ritmos intermediários.

 

Há mais biólogos de acordo em que a estase é um fenômeno real do que biólogos de acordo sobre suas causas. Os celacantos foram um grande grupo de “peixes” que existiram em grande número há mais de 250 milhões de anos e aparentemente se extinguiram mais ou menos na mesma época em que os dinossauros mas na verdade foram encontrados alguns espécimes na áfrica do sul por volta de 1938. (...) Desde então, alguns outros espécimes foram pescados na mesma área, e a espécie agora já foi devidamente estudada e descrita. É um “fóssil vivo”, pois quase não mudou desde a época de seus ancestrais fósseis, centenas de milhões de anos atrás. Portanto, existe a estase.

 

Espécies animais e vegetais em geral são imediatamente receptivas ao cruzamento seletivo, e os criadores não encontram indicio algum de forças antievolutivas intrínsecas. O máximo  que pode acontecer é os criadores encontrarem dificuldades após varias gerações de cruzamentos seletivos bem-sucedidos. Isto porque, após algumas gerações de cruzamentos seletivos, a variação genética disponível se esgota, e temos de aguardar novas  mutações. É concebível que os celacantos tenham parado de evoluir porque pararam de sofrer mutação...

 

366

Para Darwin, qualquer evolução que precisasse da ajuda de Deus para dar seus passos não era evolução coisa nenhuma.

 

Podemos ter dificuldade para imagina uma ameba transformando-se um homem, mas não temos dificuldade para imaginar uma ameba transformando-se em um tipo ligeiramente diferente de ameba. E então não é difícil imagina-la transformando-se em um tipo ligeiramente diferente de um tipo ligeiramente diferente de... e assim por diante.

 

Algo semelhante à transição da ameba para o homem ocorre em todo útero materno em apenas nove meses. Reconhecidamente, o desenvolvimento é um processo muito diferente da evolução; mesmo assim, qualquer um que seja cético quanto à possibilidade de uma transição de uma única célula para um homem precisa apenas refletir sobre seu próprio início fetal para aquietar suas duvidas.

 

368

Existem pessoas no mundo que desejam desesperadamente não ter de acreditar no darwinismo. Parecem enquadrar-se em 3 classes principais:

 

a)   aquelas que por razoes religiosas querem que a própria evolução não seja verdade;

b)   aquelas a não têm razão para negar que a evolução ocorreu mas, por motivos políticos ou ideológicos, têm aversão ao mecanismos da teoria de d.

c)   aquelas que simplesmente gostariam de entornar o caldo, talvez porque isso produza bom material jornalístico;

 

Taxonomia – a ciência da classificação.

 

Taxonomia Cladística:  onde o critério supremo para o agrupamento de organismos é a proximidade de parentesco entre primos ou, em outras palavras, o caráter relativamente recente dos ancestrais comuns.

 

Clado: palavra originada do grego, significando ramo de árvore, denominação dada a um grupo de organismos que têm a propriedade de descenderem todos de um ancestral comunicação. Ou seja, clado é o conjunto de todos os organismos descendentes de um ancestral especifico.

 

Fileticistas: taxonomistas que declaradamente tentam descobrir relações evolutivas e dividem-se adicionalmente em duas escolas de pensamento: os cladistas, que seguem os princípios e Willi Henning e os taxonomistas evolucionistas “tradicionais”. Os cladistas são obcecados por ramos. Para eles, o objetivo da taxonomia é descobrir a ordem em que as linhagens se separam umas das outras no tempo evolutivo. Não importa se essas linhagens mudaram muito ou pouco desde o ponto de ramificação. Os taxonomistas evolucionistas “tradicionais” diferem dos cladistas principalmente porque não levam em consideração apenas o tipo de evolução ramificada. Eles também levam em conta a quantidade total de mudança ocorrida durante a evolução e não apenas as ramificações.

 

375

Certa vez eu vi, em uma livraria, uma estante identificada em letras garrafais: “RELIGIÃO E UFOLOGIA”.

 

Amniotas: aves e mamíferos

 

Os organismos  nunca podem ser totalmente sem parentesco entre si, pois está praticamente certo que a vida como a conhecemos originou-se apenas uma vez na Terra.

 

Aves e mamíferos descendem de um ancestral comum, mas agora são ramos separados da arvore evolutiva e nunca mais tornarão a juntar-se: nunca haverá um híbrido de ave e mamífero.

 

378

O importante nesse sistema de círculos dentro de círculos é o fato de eles se aninharem com perfeição. Nunca, em nenhuma ocasião isolada, existe intersecção entre os círculos que desenhamos. Toda vez que há sobreposição entre dois círculos, um deles está inteiramente dentro do outro.

 

As línguas que divergiram recentemente de um ancestral comum, como o sueco, o norueguês e o dinamarquês, têm muito mais semelhanças entre si do que com línguas que divergiram há mais tempo, como o islandês.

 

383

Se uma peste curiosamente seletiva se abatesse e matasse todas as pessoas de altura intermediária, “alto” e “baixo” passariam a ter um significado tão preciso quanto “ave” e “mamífero”.

 

384

Pessoas que com freqüência são as primeiras a se encolerizar diante da menor violação dos direitos humanos são as mesmas que defendem ardorosamente seu direito de cortar chimpanzés vivos. A única razão de podermos aceitar com tanta naturalidade essa parcialidade é os intermediários entre humanos e chimpanzés estarem todos mortos.

 

O último ancestral comum de humanos e chimpanzés viveu talvez há apenas 5 milhões de anos, sendo, sem duvida, mais recente do que o ancestral comum de chimpanzés e orangotangos, e talvez 30 milhões de anos mais recente que o ancestral comum de chimpanzés e macacos não antropóides nem prossímios. (...) Ou teríamos de atribuir plenamente direitos humanos a todo o espectro (direito de voto aos chimpanzés) ou teria de haver algum sistema complexo, tipo apartheid, de leis discriminatórias, ficando a cargo dos tribunais decidir se determinados indivíduos seriam legalmente “chimpanzés” ou legalmente “humanos”; e as pessoas se preocupariam caso sua filha dissesse querer casar-se com um “deles”.

 

386

Para um não-pontuacionista, “a espécie” é definível apenas porque os intermediários incômodos estão mortos. Um antipontuacionista extremo, com uma visão de longo prazo de toda a historia evolutiva, não pode ver “a espécie” como uma entidade distinta.

 

É verdade que a grande maioria das espécies que já viveram extinguiu-se.. Também é verdade que novas espécies surgem a uma taxa que no mínimo compensa a taxa de extinção, de modo que existe um tipo de “pool de espécies” cuja composição está sempre mudando.

 

389

As adaptações complexas, na maioria dos casos, são propriedades não de espécies, mas de indivíduos. Espécies não têm olhos e corações;  os indivíduos é que têm.

 

390

É difícil conceber razoes por que a probabilidade sobreviver de uma espécie deveria ser dissociada da soma das probabilidades de sobreviver dos membros indivíduos dessa espécie.

 

Os coalas dependem totalmente da disponibilidade de eucaliptos, e uma praga dos eucaliptos análoga ao fundo do olmo acabaria com eles.  (...) Diferentemente de visão curta ou de pernas longas, a “uniformidade’  e a “variegação” são verdadeiras características pertinentes à esfera das espécies. O problema é que exemplos assim são raríssimos.

 

Se os interesses do indivíduo conflitam com os da espécie, os interesses do indivíduo – interesses de curto prazo – têm de prevalecer.

 

393

O capítulo 4 mostrou que vezes sem conta, descobrem-se semelhanças entre animais não aparentados em diferentes partes do mundo, porque  têm modos de vida semelhantes.

 

394

Durante muito tempo se acreditou que o porco-espinho africano era parente próximo dos porcos-espinhos americanos, mas hoje se julga que os revestimentos espinhosos dos dois grupos evoluíram independentemente. Presume-se que os espinhos fossem úteis pelas mesmas razoes nos dois continentes.

 

396

Hoje os taxonomistas podem comparar sentenças moleculares exatamente como poderiam comparar crânios ou ossos da perna.

 

Temos um relógio molecular bem preciso. Ele nos permite estimar não só que pares de animais têm os ancestrais comuns mais recentes, mas também aproximadamente quando viveram esses ancestrais comuns.

 

406

Os cladistas examinariam uma a uma estas 3 árvores possíveis e escolheriam a melhor. Como reconhecer a melhor árvore? Basicamente, é aquela que une os animais possuidores do maior numero de características em comum. Denominamos “grupo excluído” o animal que tem o menor numero de características em comum com os outros dois.

 

419

Os únicos elementos não-misticos que podem ser extraídos do lamarckismos moderno são: a herança de características adquiridas e o principio de uso e desuso.

 

É essa receita que comumente se designa por teoria lamarckiana da evolução. Se sucessivas gerações endurecem os pés andando descalças sobre chão áspero, cada geração , segundo a teoria, terá a pele um pouquinho mais dura do que a anterior. (...) No final, os bebes já nascerão com os pés calejados.

 

Pelo lamarckismos, as girafas ancestrais com pescoço curto precisavam desesperadamente alcançar as folhas no alto das árvores. Esforçavam-se muito para alcançar o alimento, e com isso alongavam os músculos e ossos do pescoço.

 

424

O problema é que não é possível provar que as características adquiridas nunca são herdadas. Pela mesma razão, nunca poderemos provar que não existem fadas.

 

A crença de que o universo foi criado há apenas 6 mil anos é incompatível não apenas com a biologia e a geologia ortodoxas, mas com a teoria física da radioatividade e com a cosmologia (corpos celestes a mais de 6 mil anos-luz de distancia não seriam visíveis se não existisse nada com mais de 6 mil anos).

 

426

Embora não se encontre na mesma classe da levitação pelo poder da prece, o lamarckismo ou, mais especificamente, a herança de características herdadas, está mais próximo da ponta do continuo ocupada pela “levitação” do que do extremo ocupado pelo “monstro do lago Ness”.

 

Os primeiros pré-formacionistas acreditavam que o corpo adulto era pré-formado na única célula a partir da qual se desenvolvia. Um deles imaginou que podia ver em seu microscópio um minúsculo humano – um “homúnculo” – todo encolhido dentro de um espermatozóide.

 

428

Uma receita em um livro de culinária não é, em nenhum sentido, uma planta do bolo que finalmente sairá do forno.

 

O modo como uma célula específica se comporta depende não dos genes que ela contém mas de qual subconjunto de genes é ativado naquela célula.

 

Mas suponhamos que mudamos uma palavra na receita; por ex, suponhamos que “fermento em pó” seja apagado ou trocado por “levêdo”. Existirá uma diferença no resultado das duas receitas e essa diferença deve-se a uma diferença de uma única palavra nas receitas.

 

Para o lamarckismo ser verdadeiro, seria preciso haver um gene “para” cada milímetro quadrado de pele, por exemplo.

 

E mais, se as características fossem herdadas pernas quebradas e cicatrizes de varíola seriam transmitidas às gerações seguintes exatamente como calos nos pés.

 

A maioria das características que qualquer máquina adquire à medida que envelhece tendem a ser os estragos cumulativos do tempo: ela se desgasta.

 

O darwinista, evidentemente, tem uma resposta pronta. A pele sujeita a desgaste torna-se mais espessa porque a seleção natural no passado ancestral favoreceu os indivíduos cuja pele por acaso reagia ao desgaste desse modo vantajoso.

 

436

Os animais tendem a evitar ações que, no passado, conduziram à dor. Mas a dor não é uma substância. Dor é apenas aquilo que o cérebro trata como dor.

 

439

A teoria lamarckiana depende de uma ligação frouxa e tosca:  a regra de que qualquer coisa que é muito usada seria melhor se fosse maior.

 

443

O problema da mutação como a única força evolutiva é expresso com simplicidade: como é que a mutação há de “saber” o que será e o que não será bom para o animal? (...) Por qual misteriosa sabedoria inerente o corpo escolhe sofrer mutação na direção de uma melhora e não de uma piora?

 

444

Se as mutações são aleatórias, então, por definição, não podem tender à melhora.

 

Mutações não-aleatórias:

  1. As mutações são causadas por eventos inequivocamente físicos; elas não ocorrem espontaneamente, sendo induzidas pelos chamados “mutágenos” (perigosos, pois freqüentemente causam câncer): raios X, raios cósmicos, substâncias radiativas, diversas substâncias químicas e até mesmo outros genes, denominados “genes mutatórios”.
  2. Segundo, nem todos os genes, em quaisquer espécies, têm a mesma probabilidade de sofrer mutação. Cada lócus nos cromossomos tem sua própria taxa de mutação característica. (...)
  3. Terceiro, em cada lócus dos cromossomos, seja ele um ponto quente ou não, mutações em certas direções podem ser mais prováveis do que na direção inversa. (...) Diz-se que pressão mutatória é zero em um dado lócus cromossômico se a taxa de mutação à frente nesse lócus é exatamente compensada pela taxa de mutação retrograda.

 

Se considerarmos que “mutação aleatória” significa que as mutações não são influenciadas por eventos externos, então os raios X refutam a afirmação de que a mutação é aletória.

 

Se pensarmos que “mutação aleatória” implica que todos os genes têm a mesma probabilidade de sofrer mutação, então os pontos quentes mostram que a mutação não é aleatória.

 

Se julgarmos que “mutação aleatória” implica que em todos os lócus cromossômicos a pressão mutatória é zero, então mais uma vez a mutação não é aleatória.

 

Somente se definirmos “aleatória” como “ausência de uma propensão generalizada à melhora do corpo” é que a mutação é verdadeiramente aleatória.

 

447

Variação e seleção trabalham juntas para produzir que evolução. O darwinista afirma que a variação é aleatória querendo dizer que ele não é dirigida para a melhora e que a tendência à melhora na evolução deve-se à seleção. (...) O extremo mutacionista acredita que a seleção não tem papel na evolução. A direção da evolução é determinada pela direção das mutações que se apresentam.  (...) O darwinista diz que a variação apresentada pela mutação à seleção incluiu alguns indivíduos com cérebro menor e alguns com cérebro maior; a seleção favoreceu estes últimos.  O mutacionista afirma que houve um viés em favor de cérebros maiores na variação causada pela mutação; não houve seleção (ou necessidade de seleção) depois que a variação foi apresentada. (...) Em suma: na evolução houve uma tendência favorável a cérebros maiores; esse viés poderia ter sido causado apenas pela seleção (a opinião darwinista) ou só pela mutação; podemos imaginar um contínuo entre esses dois pontos de vista, quase uma espécie de trade-off entre as duas possíveis fontes de viés evolutivo.

 

452

Apenas uma minoria das coisas que concebivelmente poderiam evoluir são de fato permitidas pelo status quo dos processos de desenvolvimento existentes. Devido ao modo como os braços se desenvolvem, é possível que mutações aumentem o comprimento dos dedos e causem o crescimento de pele entre eles. Mas pode não haver nada na embriologia das costas que permita “brotarem” asas como as dos anjos. Os genes podem sofrer mutação até ficarem roxos, mas nunca brotarão assas dos anjos em nenhum mamífero, a menos que os processos embriológicos dos mamíferos sejam suscetíveis a esse tipo de mudança.

 

Não podemos nos dar ao luxo de desconsiderar as restrições à evolução impostas pela embriologia.

 

Há um quinto aspecto no qual a mutação “poderia” ter sido não aleatória. Podemos imaginar (com muito esforço) uma forma de mutação que fosse sistematicamente tendenciosa na direção de melhorar as capacidade de adaptação do animal à vida. (...) A mutação não é sistematicamente tendenciosa na direção da melhora adaptativa, e não se conhece nenhum mecanismo que pudesse guiar a mutação em direções que fossem não aleatórias neste quinto sentido. A mutação é aleatória com respeito à vantagem adaptativa, embora seja não  aleatória em todos os outros aspectos.

 

456

Tendo encontrado um meio que se mostrou conveniente à parte aleatória de seu corpo, a espécie viveu ali pó algum tempo, até que uma nova mutação aleatória surgiu e se disseminou pela espécie. E então a espécie teve de vasculhar o mundo em busca de um novo lugar ou modo de vida onde pudesse viver com seu novo pedaço aleatório. Ao encontra-lo, o Passo 2 se completou.

 

O meio é imposto, e a espécie evolui adaptando-se a ele. A teoria de Dover vira isso de cabeça para baixo. É a natureza da espécie que é “imposta”, neste caso pelas vicissitudes da mutação e outras forças genéticas internas na qual ele tem um interesse especial.

 

A pretensa teoria rival da seleção natural proposta por Dover nunca poderia funcionar, não só em 1 milhão de anos, mas tampouco em 1 milhão de anos a mais do que o tempo de existência do universo, nem em 1 milhão de universos cada um durando 1 milhão de vezes mais.

 

459

Quase todos os povos elaboraram seu próprio mito sobre a criação, e a historia do Gênesis é apenas aquela que foi adotada por uma tribo específica de pastores do Oriente Médio. Seus status não é superior ao da crença de uma determinada tribo da África Ocidental, para quem o mundo foi criado do excremento de formigas.

 

Os teólogos modernos com um mínimo grau de refinamento desistiram de acreditar na criação instantânea. Os indícios de que existiu de fato algum tipo de evolução tornaram-se avassaladores.

 

460

O que faz da evolução uma teoria tão impecável é o fato de ela explicar como a complexidade organizada pode surgir da simplicidade primitiva.

 

Se queremos postular uma deidade capaz de arquitetar toda a complexidade organizada do mundo, seja instantaneamente, seja pela evolução guiada, essa deidade já tem de ser imensamente complexa antes de tudo.

 

A essência da vida é uma improbabilidade estatística em uma escala colossal.

 

“Domesticar” o acaso significa dividir o muito improvável em pequenos componentes menos improváveis organizados em series. Não importa quanto seja improvável que um X possa ter surgido de um Y em um único passo, sempre é possível conceber uma série de intermediários infinitesimalmente graduados entre eles.

 

Por mais improvável que uma mudança em grande escala possa ser, mudanças menores são menos improváveis. E, contanto que postulemos uma série grande o bastante de intermediários em uma graduação suficientemente pequena, seremos capazes de derivar qualquer  coisa de qualquer outra coisa, sem invocar improbabilidades astronômicas.

 

A seleção natural lenta, gradual e cumulativa é a explicação decisiva para nossa existência.

 

469

Nem todas as embriologias são igualmente “férteis” quando se trata de promover a evolução futura.

 

472

Entre os grupos de animais que têm mais êxito evolutivo estão aqueles que possuem um plano corporal segmentado. E entre as características mais fundamentais dos planos corporais dos animais estão seus planos de simetria.

 

Nós e todos os vertebrados somos segmentados. Isto está evidente em nossas costelas e coluna vertebral, cuja natureza repetitiva podemos ver não apenas nos ossos, mas nos músculos, nervos e vãos sanguíneos associados.

 

475

A invenção da segmentado foi um divisor de águas na evolução.

 

 

NOTAS AO FINAL DO LIVRO

 

    1. Deus está na criação do universo
    2. está na criação da terra
    3. está na criação do homem
    4. está no controle da evolução
    5. está no controle da vida
    6. está na vida após a morte
    7. está na ressurreição

 

 

PERGUNTAS

 

  1. Por quê não existem outras espécies de hominídeos?
  2. Como uma espécie pode surgir a partir de 1 único mutante na medida em que a probabilidade de sua mutação ser transmitida é muito pequena pois não terá uma parceira (ou parceiro) com a mesma mutação?
  3. O que é uma “síntese” no conceito químico?