EXTRATO DE: TEORIA E PESQUISA EM SOCIOLOGIA

AUTOR: DONALD PIERSON - Ex-Prof. de Sociologia de São Paulo

Ed. Melhoramentros - 1971       

 

A sociologia se dedica so estudo da organização, do equilíbrio e da desorganização do grupo e, por isto, se atém ao estudo dos atos coletivos.

Uma hipótese é uma teoria provisória.

A hipótese, em si mesma, é uma espécie de pressuposição.

A hipótese é uma pressuposição em que 1) se formula uma pergunta e 2) se sugere o modo de respondê-la.

A teoria é uma hipótese que foi submetida a teste e comprovada como verdadeira, sob determinadas condições.

Na ciência tudo tem caráter teórico: tudo é problemático, hipotético, exploratório.

"Sistema de referência" é uma organização lógica e sistemática de concepções, em que cada concepção se ajusta às demais numa maneira ordenada e completa.

O "Continuum Conceptual" [é o meu conceito de opostos. Veja-se este continuum: ]

 

amor     amizade  camaradagem      simpatia       indiferença      antipatia     antagonismo    animosidade    ódio

|________|________|________|________|________|________|________|________|

 

[Os opostos:

amor - ódio

amizada - animosidade

camaradagem - antagonismo

simpatia - antipatia

e o centro = indiferença ]

 

O processo básico por meio do qual os indivíduos humanos se  tornam capazes de combinar-se em unidades maiores e levar uma vida em comum, é o da comunicação.

As sociedades e culturas são criadas e transmitidas por meio dela. (....) Sem a comunicação nenhum de nós se tornaria "humano", dotado de linhgagem, pensamento, atitudes ou sentimentos.  Admitindo que tivéssemos sobrevivido, seríamos só animais, capazes apenas de sêde, fome, atividade sexual e mêdo.

Folkways = são as maneiras de agir (ways) que caracterizam um povo (folk). São as formas de conduta que um povo desenvolveu durante a sua vida.

Mores = são os folkways que foram destacados como particularmente importantes na vida do grupo em questão. Faz-se a distinção entre folways e mores, imaginando qual será a reação do grupo se um de seus membros não seguir um determinado costume. Se causar choque, indignação, revolta e severa reprovação, é um more.

 

CAPÍTULO IX - NATUREZA HUMANA

Grupos primários (relações íntimas) - família, brinquedos, a vila, a tribo "primitiva".

Grupos secundários (relações distantes e formais, contatos de necessidade e conveniência)

Resumo:

Natureza humana é:

1.       produto social, resultante da interação com outros seres humanos, em "grupos primários";

2.       comum a todas as raças e nacionalidades, onde quer que se encontrem;

3.       qualidade que, entre os animais, somente o homem possui;

4.       qualidade que emsmo ele não posui ao nascer

5.       qualidade que depende de "sympathy" (isto é, da capacidade assumir o papel de outrem), bem como dos sentimentos em que entra "sympathy"

6.       qualidade que se desintegra em condições de isolamento.

A natureza humana não é produto de: 1) apenas uma estrutura fisiológica peculiar; nem de 2) apenas uma herança social peculiar. Desenvolve-se quando o ser humano, possuindo a princípio apenas "equipamento" biológico, entra, e permanece, em relações "primárias" com outras pessoas. Como disse Cooley, "O homem não a tem ao nascer; adquire-a somente através de interação com os seus semelhantes, e no isolamento ela se desintegra."

 

CAPÍTULO X - HERANÇA SOCIAL

Para descobrir como é possível para os seres humanos agirem em conjunto, exige, entre outras coisas, análise daquilo cuja posse constitui a diferença principal entre o homem e os animais inferiores isto é, a herança social (cultura).

Que é herança social? É não apenas a soma como também a organização dinâmica e funcional, da língua, conhecimentos, instituições, idéias, ideais, técnicas, etc., que um povo tenha desenvolvido em resposta às condições da sua vida. Falamos a língua portuguesa, em vez de balbuciar. Sabemos que a linha reta é a distância mais curta entre dois pontos; (....) que a fusão de manganês com ferro torna o aço mais resistente. Em nossa cultura estamos certos de que se deve educar os filhos e não matá-los; de que se deve amar os velhos e não comê-los; de que não deve haver mais que um marido ou uma esposa; (....)

 

CAPÍTULO XI - ISOLAMENTO E CONTATO

Duas forças fundamentais da vida social são o isolamento [dor] e o contato [prazer]. É importantíssimo o papel que estas duas forças exercem na vida de todos os povos.

Podemos considerar a vida moderna como uma tentativa (inconsciente) para substituir os valores pessoais, e a íntima asso entre os indivíduos, que caracterizam a "cultura de folk", por valores impessoais e relações de interesse e conveniência que caracterizam a cidade moderna.

A principal qualidade da cultura de folk é o isolamento e, a da civilização é o contato.

É importante analisar o que acontece ao indivíduo que nasce na cultura isolada. Ele tem, diante de si, todo o conhecimento necessário para a solução de qualquer problema que surge na vida cotidiana; pois, sendo a sua vida relativamente estável e uniforme, se lhe deparam quase sempre os mesmos problemas que surgiram na vida dos indivíduos anteriores do seus grupo. Deste modo, as suas atividades estão traçadas antecipadamente; toda sua vida está balizada. Não é necessário deliberar para resolver problemas. Não estando assim numa situação que o force ao desenvolvimento da capacidade de resolver problemas, ele não está apto a adquirir inteligência muito alta. É por esta razão, e não por qualquer falha inerente, que ele, como se observa entre "a gente do mato", tem "mentalidade retardada".

Convém dizer que a inteligência é a capacidade de resolver problemas. Quanto menos problemas tem o indivíduo para resolver, menor probabilidade tem ele de desenvolver inteligência de ordem superior.

Um estudo indicou que nas sociedades isoladas, os gênios raramente aparecem, se é que aparecem, e a invenção é muito rara; ao passo que, nas sociedades que estão em contato com o mundo exterior, com novas idéias, atitudes, conhecimentos e pontos de vista, o gênio tem maior probabilidade de florescer, e a invenção ocorre com maior freqüência. [Isto explica operação não desenvolvimento das tribos indígenas e demonstra que o intercâmbio de conhecimento (em qualquer nível, em qualquer ambiente) melhora do desempenho global.]

Convém notar também que o divórcio, o crime, a delinquência juvenil, o suicídio e outros índices de desintegração social são relativamente desconhecidos nas sociedades isoladas.

Existem diferentes espécies de isolomente, como: 1) o espacial (isolamento provocado pelas barreiras geográficas) ; 2) o estrutural (provocado pela diferença de equipamento biológico; 3) o consuetudinário (provocado pela diferença de hábitos; e 4) o psíquico (provocado pela diferença de atitudes e sentimentos).

Os seres humanos, na maioria das vezes, não reagem diretamente uns aos outros, mas às suas respectivas atitudes; isto é, reagem ao que pensam que as outras pessoas tendem a fazer. A interpretação destas atitudes pode, naturalmente, ser errônea. Se isto acontecer, a comunidade será incompleta e o resultado um mal-entendido.

O indivíduo não perceberá a intenção alheia (....) sempre que for incapaz de viver a experiência alheia, de assumir o papel e ver o mundo do ponto de vista deste outro. A razão dos mal-entendidos é o fracasso em penetrar completamente nas atitudes das outras pessoas em apreço.

Por competição ecológica (ou biótica) referimo-nos àquela forma de competição, em que todos os organismos estão constantemente empenhados. É chamada pelos biólogos de luta pela existência, como já vimos. Fundamentalmente, é a competição pelo alimento e pela progenitura.

 

CAPÍTULO XIII - INTERAÇÃO SIMBIÓTICA E NÃO-SIMBIÓTICA

Sabemos, por exemplo, através de pesquisas sobre o assunto, que durante o processo de pensamento o indivíduo "pensa com todo o corpo". Em outras palavras, no processo de pensamento está envolvido um constante movimento muscular. Este movimento, porém, é tão ligeiro que usualmente não se percebe.

O chamado "vidente do pensamento" é, segundo todas as probabilidades, pessoa extraordinariamente sensível a esses ligeiros moviementos musculares. É provável que tal sensibilidade, tal capacidade de reagir a gestos não simbólicos, ordinariamente não percebidos por outras pessoas, seja justamente o que tem habilitado muitos "ledoes da sorte" a alcançar grande fama.

Um indivíduo que, sob influência hipnótica, recebe ordem de executar certa atividade em determinada data futura, executa-la-á, mesmo dias após ter saído do estado hipnótico. Se lhe perguntarem porque assim fez, a primeira resposta será provavelmente a razão que ele julga ser verdadeira. Se depois lhe mostrarem que essa razão não poderia ser verdadeira, porém, dará outras. Se, então, insistirem bastante, o hipnotizado finalmente se lembrará de que que "o senhor me disse para fazer isso".

 

CAPÍTULO XIV - QUATRO TIPOS FUNDAMENTAIS DE INTERAÇÃO

A qualidade principal do conflito é a luta pelo "status" (isto é, a luta por uma posição no grupo, por parte do indivíduo, ou numa série de grupos, por parte do grupo), por uma posição que corresponda à concepção que o indivíduo ou grupo tem do seu próprio papel. É interessante notar, de passagem, que o indivíduo (ou grupo) se mostra sempre desejoso de entrar em competição com os que considera superiores, mas nunca com os que considera inferiores. [Como explicar o garoto grande que insiste em brigar com o garoto menor?]

O conflito difere da competição apenas no fato de ser processo consciente. Os participantes estão agora atentos uns aos outros como competidores. Cada um pensa que o outro lhe esteja interceptando o caminho da realização de seus desejos. Em tal situação, podem surgir rivalidade, antipatia, críticas de forte tonalidade emotiva e retalizações pessoais ou de grupo.

A acomodação constitui mudança externa, mas não modificação quanto à vida interior. [O estudo de uma determinada matéria não produz mudança exterior nem interior. Como ficamos?]

Por assmilação referimo-nos à modificação na vida interior do indivíduo, desaparecendo completamente o conflito na medida em que o imigrante, por exemplo, vem a adquirir os objetivos, atitudes e sentimentos comuns do grupo entre o qual veio viver.

O mecanismo pelo qual se processa a assimilação é a imitação não intencional da conduta dos outros; e ela se realiza por meio da tendência humana que todo indivíduo tem de repetir em sua imaginação as atitudes (isto é, as tendências de agir) das pessoas que o cercam. À medida em que o indivíduo tende a enssaiar em sua imaginação o modo de agir dos outrso, começa ele a assumir inconscientemente e, sem premeditação, as atitudes destes outros.

Pelo fato de processar a assimilação inconscientemente, é fácil compreender como são infrutíferos os esforços para impor a assimilação. Normalmente, taix tentativas de coerção apenas intensificam a autoconsciência dos indivíduos em apreço, tendendo a fazer que eles agarrem-se ainda mais tenazmente a seus hábitos. (....) A intensificação da autoconsciência sempre tende a unir os imigrantes ao redor de sua cultura original.

 

CAPÍTULO XV - COMPETIÇÃO E CONFLITO

Mesmo que às vezes não o percebamos, todos nós estamos competindo uns com os outros numa luta constante pela existência.

A teoria de Malthus consta de 3 partes:

1.       a população sempre é limitada pela quantidade disponível de gêneros alimentícios;

2.       a população não só aumenta enquanto cresce a provisão de víveres, como também tende a aumentar mais rapidamente do que os víveres (é este o coração da teoria); e

3.       portanto, a fim de manter o equilíbrio entre a população e as provisões de víveres, aparecem certas limitações positivas da população, como por exemplo a guerra, a forme e a peste.

[Evidentemente, esta teoria já foi por água a baixo. A população mundial cresce mais exatamente aonde existe menor provisão (países subdesenvolvidos) e o inverso acontece nos países desenvolvidos.]

[Uma causa das guerras e pestes é o excesso de alguma coisa que está provocando um desequilíbrio na natureza.]

Ambição - Os indivíduos que se sentem socialmente inseguros são cada vez mais estimulados a exercer maior soma de esforços a fim de demonstrar sua competência. Por outro lado, nas sociedades rurais, onde os indivíduos tendem a sentir-se em relativa segurança, a ambição tende a permanecer em estado latente. [???]

As pessoas são definidas como indivíduos que possuem status.

É o conflito que desenvolve o pensamento. Aliás, o próprio pensamento surge no conflito.

Só pensamos quando temos de enfrentar algum problema, quando existe em nosso espírito um conflito entre diferentes tendências de agir. O pensamento resolve o conflito pesando as diversas possibilidades e decidindo-se por uma delas.

Quando todas as exigências da vida podem ser satisfeitas pelo comportamento costumeiro; quando todos os problemas que surgem em sua experiência podem ser facilmente resolvidos por meio do emprego de certo costume que seu povo desenvolveu há muito tempo, em face do mesmo problema, não há necessidade de pesar as alternativas de de toamr decisões, isto é, de pensar.

 

CAPÍTULO XVI - ACOMODAÇÃO E ASSIMILAÇÃO

O conflito proveniente de conquista pode dar origem a uma das formas de acomodação, que é a escravatura.

Se a acomodação pode ser comparada à simples mistura de substâncias, a assimilação pode ser comparada a um novo composto químico; ou talvez, ainda mais apropriadamente, à fusão de uma nova liga.

Deve-se dintinguir entre acomodação (conceito sociológico) e adaptação (conceito biológico).  A sobrevivência da espécie é resultado da adaptação; a educação é uma forma de acomodação.

Assimilação - são dois os principais problemas: 1) definir o processo; e 2) descobrir as circunstâncias em que este se realiza. A assimilação se dá através da imitação despercebida, isto é, por meio da tendência para ensaiar, na própria imaginação, como já vimos, as atitudes (isto é, as tendências para agir) das outras pessoas com quem se está em contato.

A língua é o mais eficiente dos meios de comunicação que os seres humanos têm desenvolvido. [A minoria que não conhece a língua da maioria, se isola.]

 

CAPÍTULO XVII - COMPORTAMENTO COLETIVO

Os atos do indivíduo - "No começo de qualquer ato de comportamento autodeterminado, há sempre um estágio de deliberação e exame, a que podemos chamar definição da situação.()"

A definição da situação  pode vir: 1) através de uma sugestão, transmitida a) por outro indivíduo, ou b) por qualquer outro objeto; ou 2) através da descoberta acidentala de um ato satisfatório. A "atividade manifesta" (overt) então aparece. Queremos com isto dizer que os movimentos, a princípio descoordenados, agora adquiriram alvo e, portanto, coordenaram-se em um tão organizado.

Podemos, assim analisar as diferentes fases consecutivas do ato, segundo a seguinte sequencia de acontecimentos: 1) inquietação do organismo vivo; 2) movimentos descoordenados (random); 3) surto de alguma necessidade; 4) "definição daa situação"; 5) atividade manifesta (overt); 6) realização do alvo desejado; 7) satisfação; 8) repouso (equilíbrio) ou 9) começo de um novo ato.

 

CAPÍTULO XIX - O QUE TORNA HUMANO O INDIVÍDUO

A psicologia e sociologia fundem-se na Psicologia Social.

A essência da natureza humana - O ponto principal é que o ser humano, a fim de poder julgar-se a si mesmo, precisa "exteriorizar-se, por-se no lugar de seus semelhantes, assumir seus papéis, olhar-se a si mesmo com os olhos dos outros. A natureza humana é nada maenos nada mais, que esta capacidade de assumir os papéis de outras pessoas. É exatamente isto que queremos significar quando dizemos de certa pessoa: "Ela é humana". Queremos dizer que ela é capaz de exercer "sympathy", isto é, de possuir em si mesma um sentimento distintamente humano, que surge da capaidade de assumir o papel de outrem.

Aquele indivíduo cuja concepção de si mesmo não está de acordo com o seu status, é pessoa isolada psiquicamente. É socialmente desajustado e, portanto, infeliz, porque concebe a si mesmo c tendo direito a uma posição que seus associados não lhe concedem.

 

 

CAPÍTULO XX -- DOS MOTIVOS SOCIAIS DA CONDUTA HUMANA

W. I. Thomas sugeriu que os desejos humanos incidem em 4 categorias gerais: 1) desejos de correspondência; 2) desejos de alto apreço (recognition); 3) desejos de novas experiências; 4) desejos de segurança. [Pra mim são necessidades: 1) de se relacionar com o outro; 2) de se sentir importante para o outro; 3) de se sentir superior ao outro; 4) de se sentir protegido do outro.]

Parece que todos os homens têm esse "anseio pela apreciação íntima e preferencial por parte dos outros", sendo o grau disso variável com a pessoa em apreço.

A hipótese dos "4 tipois de desejos" de Thomas inclui não somente a concepção de que esses desejos constituem motivações básicas e universais, como também a de que a satisfação, ao menos de certo grau, de todos os 4 tipos é imprescindível para se ter personalidade sadi. Se uma ou mais dessas categorias de desejos ficarem insatisfeitos, o comportamento do indivíduo em questão pode se tornar patológico. O comportamento, para ser normal, tem de ser integrado, isto é, dominado pela personalidade toda; e isso exige a satisfação ssadia de todos os 4 tipos.

Deve-se notar ainda que esses 4 tipos de desejos são reciprocamente exclusivos; não se pode substituir à satisfação de um tipo pela satisfação de outro.

Esta teoria sutenta, ainda, que, embora não se possa substitui a satisfação de um tipo de desejo pela satisfação de outro, pode-se fazer substituição dentro da categoria do próprio desejo.

Note-se ainda que a teoria dos 4 tipos sugere que, em cada indivíduo, um dos tipos tende a predominar e a subordinar a si todos os outros. Assim, pode ser que em certa pessoa predomine o desejo de novas experiências; noutra, o de correspondência; numa terceira, o de alto apreço; numa quarta, o de segurançaa. Tal predomínio, poprém, não é necessáriamente permanente; tende a modivicar-se durante a vida do indivíduo, e se acentua com a idade, de modo que muitas pessoas, que antes se sentiam sempre desejosas de novas experiências, por exemplo, se tonam cada vez mais influenciadas pelo desejo de "segurança".  [Isto tudo trata de necessidade e, como tal, são mutáveis a cada momento. Mas esta teoria nos ajuda a: 1) explicar o comportamento humano; 2) direcionar este comportamento; 3) predizer o comportamento humano.]

Papel - atividade de uma pessoa no grupo social a que pertence; é o aspecto dinâmico de status.