EXTRATO DE: O TIGRE BRANCO

Autor: Aravind Adiga

Editora Nova Fronteira: 2008/2008

 

É a maldição do empresário. Ele precisa cuidar do seu negócio o tempo todo.

Agora, tem gente que acha que nem todos esses deuses existem de verdade. Alguns acreditam até que nenhum deles existe. Que somos apenas nós e um oceano de escuridãp à nossa volta. Não dou filósofo, nem poeta. Como poderia então saber a verdade? É certo que todos esses deuses parecem trabalhar muito pouco – exatamente como os nossos políticos – e, mesmo assim, continuam sendo reeleitos para ocupar seus tronos dourados no céu, ano após ano.

 

Meu pai ficou doente por algum tempo, mas não existe nenhum hospital em Laxmangarh, embora haja três pedras fundamentais diferentes, lançadas por três políticos diferentes, antes de três eleições diferentes.

 

O simples fato de os motoristas e os cozinheiros de Déli lerem a Assassinato Semanal não significa que todos estejam prestes a cortar o pescoço de seus patrões. É claro que adorariam fazer isso. É claro que um bilhão de empregados allimentam, secretamente, a fantasia de estrangular o patrão – e é por isso que o governo da índia publica essa revista e a vende pelas ruas pelo preço módico de quatro rupias e meia, para que até os pobres possam comprá-la.

 

Quando o seu motorista começar a ler sobre Gandhi e Buda, aí, sim, Mr. Jibao, é  hora de se mijar nas calças.

 

Os empregados precisam maltratar outros empregados. Aqui, somos criados para isso, exatamente como os pastores alsacianos são criados para atacar os estranhos. Nós atacamos qualquer um que nos seja familiar.

 

Esta é uma velha e respeitável tradição entre os criados: esbofetear o patrão quando ele apagou. Ou pular em cima dos travesseiros quando não tem ninguém por perto. Mijar nas plantas da casa. Ou ainda chutar ou estapear seus cachorrinhos de estimação. São prazeres inocentes dos empregados.

 

Atualmente, sr. primeiro-ministro, milhares de estrangeiros viajam para o meu país a cada dia, buscando a iluminação. Vão para os Himalaias, para Benares ou para Bodh Gaya. Fazem umas poses estranhíssimas de ioga, fumam haxixe, transam com um ou dois sadhus e acham que estão se tornando iluminados. Ha!

 

Uma revolução na Índia?

Não, Sr. Primeiro-ministro. Não tem a menor chance. O povo deste país continua esperando que a guerra que vai libertá-lo venha de algum outro lugar – das florestas, das montanhas, da China, do Paquistão. Isso nunca vai acontecer. Cada homem tem de fazer sua própria Benares.

 

Não demora muito e os brancos vão estar extintos. Existem ainda os negros e os vermelhos, mas não tenho ideia do que esses aí  andam fazendo – nunca se fala deles no rádio. A minha humilde predição é que, em vinte anos, só haverá amarelos e marrons no topo da pirâmide, e nós é que vamos governar o mundo.

E que Deus proteja todos os demais.

 

Mesmo que todos os meus lustres venham a se espatifar no chão; mesmo que me ponham na cadeia e todos os outros prisioneiros me enrabem; mesmo que me façam subir a escada de madeira para enfrenta a corda de uma forca, nunca vou admitir que cometi um erro naquela noite, em Déli, quando cortei a garganta do meu patrão.

Acredito que valeu a pena saber, por um dia, uma hora, um minuto que fosse, o que significa não ser escravo.

Ha!

 

Muito Cordialmente,

Ashok Sharma

O Tigre Branco

De Bangalore