O FOCO, CADÊ O FOCO? - II

 

 

Vou me arriscar por um caminho repleto de armadilhas. Poderei morrer pela boca - ou melhor dizer pelo teclado? - mas é o risco da jornada. Vou tentar separar três coisas: foco, posicionamento e conceito de comunicação. Foco diz respeito às suas habilidades e aos critérios que você vai se impor para separar o joio do trigo em relação aos conhecimentos que você deve absorver. O foco é o motor do barco. Ele é responsável por fazer com que você se mova e quanto melhor o motor - mais potente -, mais rápido você avança. Quanto mais você se especializa em alguma coisa, mais rapidamente você “conquista” o mercado. Quando não existe foco (motor) fica-se à deriva. Já um barco sem leme é um barco desgovernado. Sem rumo. É aí que aparece o posicionamento, responsável por definir o seu destino e, por conseqüência, a direção que você tem a tomar. O posicionamento é o uso do foco para atingir um determinado objetivo. Mas há que considerar o vento, e entre vento a favor e vento contra, fique com um bom conceito de comunicação. a mensagem síntese que informa “qual é a sua”. Se você tem foco e posicionamento, dependendo de algumas circunstâncias, você pode prescidir dele, mas que ajuda, ajuda. O conceito de comunicação é o vento a favor, o “plus” que acelera a divulgação de suas habilidades junto ao seu público-alvo.

 

Quando uma indústria decide só fabricar geladeiras e máquinas de lavar, ela está definindo seu foco. Tal decisão irá determinar, como é moda dizer, suas “expertises”. Quando ela decide fabricar os melhores produtos do mercado desta categoria, ela está posicionando seu produto comparativamente aos concorrentes e, consequentemente, definindo seu potencial público consumidor (aqueles que podem pagar para ter a melhor geladeira do mercado). E quando ela propaga que “uma geladeira qualquer não é nenhuma Brastemp”, ela está divulgando seu conceito de comunicação. Ou seja, a mensagem síntese sobre a qual ela irá apoiar seus esforços de comunicação.

 

Não é importante que você concorde com minha metáfora. O importante, parafraseando o Banco Real, é refletir sobre o foco. Posicionamento sem foco, é conversa fiada. Conceito sem posicionamento é tiro n’água. Conceito sem foco é desastre à vista. Mas, tendo foco, sobrevive-se sem conceito de comunicação e sem posicionamento.

 

E não há campanha publicitária que dê jeito em empresa que não tenha foco. Por quantos anos o Nacional usou o conceito do guarda-chuva para vender tudo? E cadê o Nacional? Por trás de toda empresa que desaparece do mercado está a perda de foco. (Relembro: perder foco é dispersar seus conhecimentos, é perder a concentração sobre suas maiores habilidades.)

 

O foco é capaz de, por si só, construir um mercado. Por maior que seja o poder da mídia de massa, ela não consegue superar o extraordinário poder do boca-a-boca (hoje já podemos falar num email-a-email). Acontece que quando nos tornamos o melhor em algo - e isto só é possível através do foco - o mundo, literalmente, cai no seu colo. A questão é saber se o tamanho deste “mundo” é suficiente para suas ambições e necessidades.

 

Uma outra maneira de ver o foco é como rótulo. Na verdade, o rótulo é a tradução popular espontânea do foco. Para sermos lembrados, precisamos ser rotulados. Guarde esta: se você não é rotulado de alguma forma, significa que você não é lembrado. Para o bem ou para o mal. Um ditado popular atravessa gerações: cria fama e deita na cama. O conceito de comunicação usado para a Brastemp foi criado, na verdade, pelo público consumidor. A Brastemp só fez reproduzir na “telinha” o que já estava na boca do povo.

 

E chegamos ao lado ruim da coisa. Quer dizer, do foco. A minha geração de publicitários assistiu ao fim do mercado de fotocomposição. Quebradeira geral entre os que não foram rápidos no gatilho para realizar as mudanças necessárias à sobrevivência. Dou um outro exemplo, este fulminante. No inicio dos anos 70 era profícua a profissão de lapidador de diamante. Mas alguma coisa mudou na tecnologia ou no mercado internacional, e eu assisti meu tio ficar sem trabalho da noite para o dia. Literalmente, não é força de expressão. Sem trabalho e sem alternativa. O que um lapidador sabe fazer além de lapidar?

 

O risco do foco, portanto, é o foco muito “focado”. Mas grandes ganhos envolvem grandes riscos. É uma lei econômica. O foco traz, indubitavelmente, grandes ganhos. E altos riscos. Para minimizá-los, na medida em que se deseja a continuidade, é preciso criar um mecanismo de proteção que consiga mantê-lo, como pessoa ou empresa, atualizado com as ameaças à sua continuidade. O que não é fácil de conseguir porque esta ameaça, na maioria das vezes, não vem do seu concorrente direto. Ela vem de fora do seu mercado. De algum setor, de alguma tecnologia, de algum país, enfim, de alguma direção para a qual você não está olhando. Você está tão concentrado no seu foco que tudo o mais não lhe chama a atenção. Perigo! Perigo! Perigo!

 

Mas a história econômica atesta que o sucesso só advém para quem mantém o foco. Não conheço alternativa. O foco cria especialização. O foco facilita a comunicação. O foco acelera a propagação da mensagem. O foco nos mantém atualizados com o que há de mais moderno. O foco nos torna mais seguros sobre nossas habilidades. O foco nos faz captar mais fácil e rapidamente os desejos de nosso público-alvo. O foco nos permite economia de escala. O foco proporciona custos operacionais e administrativos menores. O foco nos torna mercadoria de valor para a mídia. O foco nos faz ser a primeira URL a aparecer quando nosso público-alvo usa seus mecanismos de busca para encontrar nossas palavras-chaves.

 

Por que insisto neste assunto? Porque ter foco é fácil, mas mantê-lo... aí o foco é mais em baixo. Assim, além de, obviamente, oferecer algo que o mercado queira, é preciso adicionar a uma determinação inabalável, pelo menos um entre três outros ingredientes: talento inato (ou herdado), capital de sobra e bons relacionamentos na mídia. Ao questionar a probabilidade de sucesso de uma empreitada, sua ou de terceiros, não deixe de perguntar: o foco, cadê o foco?

 

Paulo Vogel

 

P.S.: Estou em dúvida se escrevo ou não mais um capítulo desta novela. Penso estar faltando uma reflexão sobre “como determinar o foco”. Vou decidir com base na opinião de meus pacientes leitores. Ficamos combinados assim: mande mensagem para .....com.br, colocando no “subject” o seu voto: “por mais foco” ou “pelo fim do foco”.